Como posso obter a Escritura e o Registro do meu imóvel com gratuidade nos Cartórios?
Por @juliomartinsnet | O DIREITO À GRATUIDADE tem matriz constitucional e está previsto no inciso LXXIV da Carta Magna. Na prática, se o direito perseguido está na via judicial a gratuidade será concedida pelo Magistrado na instrução processual, mediante pedido e comprovação. Se o direito perseguido concretiza-se nas vias extrajudiciais (como por exemplo, na obtenção da Escritura e no Registro – ambos alcançados no Cartório de Notas e no Cartório do Registro de Imóveis) a obtenção da gratuidade deverá obedecer ao que ditar as normas ESTADUAIS para sua concessão, tudo à luz da CONSTITUIÇÃO FEDERAL e das normas infraconstitucionais – como por exemplo, o CPC/2015 (art. 98) que expressamente informa estar abrangido na GRATUIDADE DE JUSTIÇA “os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial”.
NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO a norma matriz que regula a concessão das gratuidades está no ATO NORMATIVO 27/2013 editado conjuntamente pelo TJRJ e pela CGJ depois de ordem expressa do CNJ (PCA 0002680-31.2013.2.00.0000, 0003018-05.2013.2.00.0000 e PP 0002872-61.2013.2.00.0000) que em 22/10/2013 determinou a revogação de ato normativo anterior e a edição de novo ato que regulasse a GRATUIDADE NOS CARTÓRIOS não autorizando que os Cartórios exigem qualquer documento comprobatório do direito (tarefa que deve ser relegada APENAS aos Magistrados). A íntegra do ato pode ser conferida em nosso site: http://www.juliomartins.net/pt-br/node/156.
A gratuidade – que é DIREITO de quem não pode pagar pelo REGISTRO e pela LAVRATURA da Escritura, por exemplo – deverá abarcar tanto a LAVRATURA DA ESCRITURA quando o seu REGISTRO e demais atos necessários, não sendo – repita-se – facultado ao Tabelião ou ao Registrador qualquer exigência de comprovação de renda, sendo – na forma do art. 2º da referida norma – necessária e SUFICIENTE a apresentação de declaração de pobreza, a qual deverá ser formalizada por escrito e assinada pelo interessado na prática do ato. Caso o Delegatário tenha algum fundamento para se colocar em dúvida a PRESUNÇÃO QUE DECORRA DA DECLARAÇÃO DE POBREZA, o Oficial Registrador ou Tabelião deverá suscitar dúvida ao Juízo competente, no prazo de 72 horas a contar da apresentação do requerimento, expondo as suas razões.
Importante anotar que o pedido de gratuidade pode e deve ser feito sem a assistência de Advogado ou Defensor Público pois este não é um requisito: ou seja, basta o pedido do interessado, sem qualquer requerimento ou ofício de Advogado ou Defensor Público (cf. inclusive AVISO CGJ/RJ 1405/2018)- diretamente no Cartório pretendido, sem qualquer prévia distribuição aos Fóruns (vide AVISO CGJ/RJ 922/2020).
Recentemente o Egrégio CONSELHO DA MAGISTRATURA do TJRJ reconheceu o acerto da decisão da ilustre Magistrada, Dra. Lívia Gagliano da Comarca de Itaboraí/RJ ao prestigiar o direito constitucional do usuário ao ter o seu registro feito sob o pálio da GRATUIDADE DE JUSTIÇA, desprovendo por unanimidade o recurso do Oficial do Cartório do RGI reclamado:
“TJRJ. 0002699-55.2021.8.19.0023. J. em: 23/09/2021 – CONSELHO DA MAGISTRATURA. Recurso de Apelação. Serviço Registral. Requerimento de Gratuidade de Emolumentos para a expedição de registro do instrumento particular de contrato de financiamento para aquisição de imóvel, venda e compra de imóvel e constituição de alienação fiduciária, entre outras avenças. (…). Hipossuficiência econômica. Sentença de improcedência da Dúvida. Inconformismo. Inconformismo do Oficial Suscitante. Parecer da Douta Procuradoria pelo conhecimento e desprovimento do recurso. Comprovada a hipossuficiência econômica da parte interessada. (…). Aplicação do artigo 2º do Ato Normativo Conjunto TJ/CGJ nº 27/2013. A apresentação de declaração de pobreza por escrito é SUFICIENTE para efeitos de solicitação de gratuidade na prática de ato extrajudicial ao fundamento da hipossuficiência. Garantia Constitucional prevista no art. 5º, LXXIV da Constituição Federal. Desprovimento do recurso”.
É nula a doação entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens.
Em se tratando de regime de bens em que os cônjuges possuem a copropriedade do acervo patrimonial que possuíam e que vierem a adquirir na constância do vínculo conjugal, destaca-se, desde logo, a manifesta impossibilidade de que haja doação entre cônjuges casados sob esse regime, na medida em que, se porventura feita a doação, o bem doado retornaria, uma vez mais, ao patrimônio comum amealhado pelo casal.
Conquanto essa matéria não tenha sido amplamente debatida nesta Corte, há antigo precedente exatamente no sentido de que “a doação entre cônjuges, no regime de comunhão universal de bens, é nula, por impossibilidade jurídica do seu objeto” (AR 310/PI, 2ª Seção, DJ 18/10/1993).
Por fim, na vigência do Código Civil de 1916, a existência de descendentes ou de ascendentes excluía o cônjuge sobrevivente da ordem da vocação hereditária, ressalvando-se, em relação a ele, todavia, a sua meação, de modo que, reconhecida a nulidade da doação entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens, deve ser reservada a meação do cônjuge sobrevivente e deferida aos herdeiros necessários a outra metade.
Veja o acórdão:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO ENTRE CÔNJUGES CASADOS. REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. NULIDADE. LEGÍTIMA. SÚMULA N. 7 DO STJ. AUSÊNCIA DE SEMELHANÇA ENTRE OS CASOS CONFRONTADOS. HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. A respeito da pretendida aplicação da Súmula n. 7 do STJ, tal óbice decorre do exame, caso a caso, dos termos das razões recursais e do acórdão então recorrido. Em tal contexto, sendo diferentes as mencionadas peças processuais, com conteúdos próprios, neste processo e no respectivo paradigma (AgInt no AREsp n. 1.359.787/MG), não há como reconhecer a similitude fático-jurídica e a divergência entre os acórdãos confrontados. 2. O acórdão paradigma proferido no julgamento do REsp n. 57/PI está superado, tendo em vista que foi rescindido no posterior julgamento da AR n. 310/PI, invocada inclusive como precedente no próprio acórdão impugnado nos embargos de divergência. 3. Quanto ao REsp n. 5.325/SP, tal paradigma anulou apenas a parte inoficiosa, excedente da disponível, por avançar na legítima dos herdeiros. Essa orientação é irrelevante para o presente caso, em que o fundamento principal – o qual permanece inalterado – que ensejou a integral nulidade da doação foi o fato de que esse negócio jurídico envolveu cônjuges casados pelo regime da comunhão universal de bens. 4. Com a interposição de embargos de divergência em recurso especial, tem início novo grau recursal, sujeitando-se o embargante, ao questionar decisão publicada na vigência do CPC/2015, à majoração dos honorários sucumbenciais, na forma do § 11 do art. 85, quando indeferidos liminarmente pelo relator ou se o colegiado deles não conhecer ou negar-lhes provimento. 5. Majorados os honorários sucumbenciais na decisão monocrática, ora agravada, descabe majorá-los novamente no julgamento deste agravo interno. 6. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – AgInt nos EREsp 1787027/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 30/03/2021, DJe 16/04/2021)
Descumprimento do livramento condicional não impede concessão do indulto
O descumprimento das condições impostas para o livramento condicional não pode ser invocado para impedir a concessão do indulto, a título de não preenchimento do requisito subjetivo.
A controvérsia cinge-se à possibilidade de considerar o descumprimento das condições do livramento condicional como falta grave, apta a obstaculizar a concessão do indulto.
Segundo a jurisprudência deste Tribunal Superior, para a análise do pedido de indulto ou comutação de penas, o magistrado deve restringir-se ao exame do preenchimento dos requisitos previstos no decreto presidencial, uma vez que os pressupostos para a concessão da benesse são da competência privativa do presidente da República. Dessa forma, qualquer outra exigência caracteriza constrangimento ilegal.
O art. 3º do Decreto n. 7.873/2012 prevê que apenas falta disciplinar de natureza grave prevista na Lei de Execução Penal cometida nos 12 (doze) meses anteriores à data de publicação do decreto, pode obstar a concessão do indulto.
É cediço, portanto, que o descumprimento das condições do livramento condicional não encontra previsão no art. 50 da Lei de Execuções Penais, o qual elenca de forma taxativa as faltas graves. Eventual descumprimento de condições impostas não pode ser invocado a título de infração disciplinar grave a fim de impedir a concessão do indulto.
Desse modo, não há amparo no decreto concessivo para que faltas disciplinares não previstas na LEP sejam utilizadas para obstar a concessão do indulto, a título de não preenchimento do requisito subjetivo.
Veja o acórdão:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. INDULTO. DECRETO N. 7.873/2012. INDEFERIMENTO. REQUISITO SUBJETIVO NÃO PREENCHIDO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. DESCUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES. CONDUTA NÃO PREVISTA COMO FALTA GRAVE NA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. AGRAVO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DESPROVIDO. 1. Segundo a jurisprudência deste Tribunal Superior, para a análise do pedido de indulto ou de comutação de penas, o magistrado deve restringir-se ao exame do preenchimento dos requisitos previstos no decreto presidencial, no caso, o Decreto n. 7.873/2012, uma vez que os pressupostos para a concessão da benesse são da competência privativa do Presidente da República. 2. O art. 3º do Decreto n. 7.873/2012 prevê que apenas falta disciplinar de natureza grave prevista na Lei de Execução Penal cometida nos 12 (doze) meses anteriores à data de publicação do decreto pode obstar a concessão do indulto. 3. O descumprimento das condições impostas para o livramento condicional não pode ser invocado para impedir a concessão do indulto, a título de não preenchimento do requisito subjetivo, porque não encontra previsão no art. 50 da Lei de Execuções Penais, o qual elenca de forma taxativa as faltas graves. 4. Mantém-se a decisão singular que não conheceu do habeas corpus, por se afigurar manifestamente incabível, e concedeu a ordem de ofício para determinar que o pedido de indulto seja novamente analisado pelo Juízo da execução, afastado o óbice quanto ao reconhecimento de falta grave por descumprimento das condições do livramento condicional. 5. Agravo regimental do Ministério Público Federal desprovido. (AgRg no HC 537.982/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 13/04/2020, DJe 20/04/2020)
Por demora do INSS é possível o segurado receber aposentadoria por invalidez e auxílio-doença.
Benefício por incapacidade. Aposentadoria por invalidez e auxílio-doença. Demora na implementação do benefício. Exercício de atividade remunerada pelo segurado. Necessidade de subsistência do segurado. Possibilidade de recebimento conjunto da renda do trabalho e das parcelas retroativas do benefício até a efetiva implantação. Tema 1.013.
No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do Regime Geral de Previdência Social – RGPS – tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.
Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nos arts. 2º, VI, e 33 da Lei n. 8.213/1991. Em algumas hipóteses, a substitutividade é abrandada, como no caso de ser possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da Lei n. 8.213/1991). Em outras, a substitutividade resulta na incompatibilidade entre as duas situações (benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença por incapacidade e aposentadoria por invalidez.
É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda, que a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como se infere do requisito da incapacidade total previsto nos arts. 42 e 59 da Lei n. 8.213/1991, com ressalva ao auxílio-doença.
No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS) estabelece como requisito a incapacidade “para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência”, e, desse modo, a volta a qualquer atividade resulta no automático cancelamento do benefício (art. 46).
Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja “incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual”. Desse modo, a função substitutiva do auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais e com exceção a elas o segurado poderá trabalhar em atividade não limitada por sua incapacidade.
Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei n. 8.213/1991, a Lei n. 13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com as seguintes redações, respectivamente: “O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade; e, na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer atividade diversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada a incapacidade para cada uma das atividades exercidas”.
Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa estabelecer o ponto diferencial entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui, na situação fática, o segurado requereu o benefício, que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve seu direito na via judicial. A lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado volta a trabalhar.
O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo trabalho, o suprimento da sua subsistência.
No caso, por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado, ainda que incapacitado, teve de trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Dessarte, a remuneração por esse trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária.
O princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia previdenciário por ter privado o segurado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
Constata-se que, ao trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está o segurado atuando de boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
Veja o acórdão:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA. IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA 1. O tema repetitivo ora controvertido consiste em definir a “possibilidade de recebimento de benefício, por incapacidade, do Regime Geral de Previdência Social, de caráter substitutivo da renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), concedido judicialmente em período de abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o deferimento do benefício. ” 2. Os fatos constatados no presente Recurso Especial consistem cronologicamente em: a) o segurado teve indeferido benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) na via administrativa; b) para prover seu sustento, trabalhou após o indeferimento e entrou com ação judicial para a concessão de benefício por incapacidade; c) a ação foi julgada procedente para conceder o benefício desde o requerimento administrativo, o que acabou por abranger o período de tempo em que o segurado trabalhou; e d) o debate, travado ainda na fase ordinária, consiste no entendimento do INSS de que o benefício por incapacidade concedido judicialmente não pode ser pago no período em que o segurado estava trabalhando, ante seu caráter substitutivo da renda e à luz dos arts. 42, 46 e 59 da Lei 8.213/1991. 3. A presente controvérsia e, consequentemente, a tese repetitiva que for fixada não abrangem as seguintes hipóteses: 3.1. O segurado está recebendo regularmente benefício por incapacidade e passa a exercer atividade remunerada incompatível com sua incapacidade, em que não há o caráter da necessidade de sobrevivência como elemento que justifique a cumulação, e a função substitutiva da renda do segurado é implementada de forma eficaz. Outro aspecto que pode ser analisado sob perspectiva diferente é o relativo à boa-fé do segurado. Há jurisprudência das duas Turmas da Primeira Seção que analisa essa hipótese, tendo prevalecido a compreensão de que há incompatibilidade no recebimento conjunto das verbas. A exemplo: AgInt no REsp 1.597.369/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 13.4.2018; REsp 1.454.163/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; e REsp 1.554.318/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2.9.2016. 3.2. O INSS alega o fato impeditivo do direito (o exercício de trabalho pelo segurado) somente na fase de cumprimento da sentença, pois há elementos de natureza processual prejudiciais à presente tese a serem considerados, notadamente a aplicabilidade da tese repetitiva fixada no REsp 1.253.513/AL (Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe de 20.8.2012). RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA 4. Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nos arts. 2º, VI, e 33 da Lei 8.213/1991. Em algumas hipóteses, a substitutividade é abrandada, como no caso de ser possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991). Em outras, a substitutividade resulta na incompatibilidade entre as duas situações (benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença por incapacidade e aposentadoria por invalidez. 5. Desses casos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é pressuposto que a incapacidade total para o trabalho seja temporária ou definitiva, respectivamente. 6. Como consequência, o Regime Geral de Previdência Social arca com os citados benefícios por incapacidade para consubstanciar a função substitutiva da renda, de forma que o segurado que não pode trabalhar proveja seu sustento. 7. A cobertura previdenciária, suportada pelo regime contributivo solidário, é o provimento do sustento do segurado enquanto estiver incapaz para o trabalho. 8. É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda, que a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como se infere do requisito da incapacidade total previsto nos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/1991, com ressalva ao auxílio-doença. 9. No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS) estabelece como requisito a incapacidade “para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência”, e, desse modo, a volta a qualquer atividade resulta no automático cancelamento do benefício (art. 46). 10. Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja “incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual”. Desse modo, a função substitutiva do auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais o segurado poderá trabalhar em atividade não limitada por sua incapacidade. 11. Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei 8.213/1991, a Lei 13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com a seguinte redação (grifos acrescentados): “§ 6º O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade. § 7º Na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer atividade diversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada a incapacidade para cada uma das atividades exercidas.” 12. Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa estabelecer o ponto diferencial entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui o segurado requereu o benefício, que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve seu direito na via judicial; já a lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado volta a trabalhar. 13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. 14. O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo trabalho, o suprimento da sua subsistência. 15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Dessarte, a remuneração por esse trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária. 16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia previdenciária, pois, por culpa sua – indeferimento equivocado do benefício por incapacidade -, o segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura previdenciária, inerente aos mencionados benefícios. 17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito. 18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral. 19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp 1.573.146/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017; AgInt no AgInt no AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 10.10.2018; AgInt no REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 2.8.2018; AgInt no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 6.6.2019; e REsp 1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 25.5.2018. FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA 20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.” RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fls. 199-200/e-STJ): “Verifica-se, dos autos, que a data de início do beneficio fixada na r. sentença e no acórdão foi 14/05/2012, diferentemente do que alega o INSS. E ainda que a parte autora tenha continuado a trabalhar, de tal fato não se deduz que estivesse válida para o trabalho, visto que a sua incapacidade laboral restou comprovada por meio de prova técnica. É de se presumir que o retorno ao trabalho se deu por questões de sobrevivência, em que pesem as suas condições de saúde.” 22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do CPC/2015. CONCLUSÃO 23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015. (REsp 1788700/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2020, DJe 01/07/2020)
Mesmo sendo inaplicável à Caixa Econômica Federal o regramento da responsabilidade civil objetiva do Estado, por se tratar a ré de empresa pública que executa atividade econômica de natureza privada, tanto órgãos públicos como suas empresas estão obrigados à prestação de serviços adequados, eficientes e seguros, respondendo na forma do CDC pelos danos derivados do descumprimento de tais deveres.
Com base nesse entendimento, o juiz Matheus Lolli Pazeto, da 4ª Vara Federal de Criciúma, condenou a CEF a indenizar um cliente que foi negativado por conta do erro de uma lotérica que cobrou um centavo a menos do que o valor acordado.
Segundo os autos, o cliente teve seu nome incluído no SPC/Serasa em decorrência de uma dívida com o banco, mas negociou um acordo e recebeu um e-mail com o boleto para pagamento no valor de R$ 1.215,91, no dia 20 de agosto de 2020, para quitar toda a dívida.
Apesar de fazer o pagamento, continuou negativado junto aos órgãos de proteção ao crédito devido a um erro da lotérica onde pagou o boleto, que cobrou um centavo a menos. Em sua defesa, a Caixa argumentou que não houve falha do banco no processamento do pagamento, já que o valor pago foi menor que o acordado.
Ao analisar o caso, o magistrado apontou que a própria Caixa, após o ajuizamento da ação, admitiu que o erro de apenas um centavo não poderia impedir a formalização do acordo e retirou o nome do autor do Serasa.
"Nesse contexto, inobstante o autor tenha adimplido o débito em 18/08/2020, a ré manteve o nome dele em cadastros restritivos de crédito até 31/12/2020. Assim, embora o caso não se trate de inscrição indevida, pois quando realizada era legítima, tem-se atraso na exclusão, o que configura um ato ilícito", ponderou o julgador.
Ele também lembrou que a inscrição indevida nos órgãos de proteção de crédito, por si só, acarreta dano moral, sendo desnecessária a comprovação de repercussão concreta à honra ou ao crédito do prejudicado. Diante disso, condenou o banco a indenizar o cliente em R$ 10 mil.
O autor da ação foi representado pelo advogado Fábio Ferreira Nascimento, do escritório Magnago & Augusto Advogados Associados.
Clique aqui para ler a decisão 5010341- 69.2020.4.04.7204
Cliente acreditou estar contratando um empréstimo consignado quando na verdade pactuou empréstimo pessoal.
O juiz de Direito Evandro Portugal, da 19ª vara Cível de Curitiba/PR, condenou um banco a indenizar consumidora idosa em R$ 15 mil a título de danos morais. Ao decidir, o magistrado considerou as taxas abusivas do contrato, de 628% de juros ao ano, e que a financeira induziu a cliente em erro, já que ela pretendia contratar um empréstimo consignado e acabou pactuando um empréstimo pessoal.
Na ação, a autora alegou que contratou três empréstimos pessoais acreditando serem consignados e que as taxas de juros cobradas pelo banco (18% ao mês) são abusivas e superiores à taxa média do mercado.
A financeira, em sua defesa, sustentou que houve ciência e concordância da parte autora em contratar débito em conta, alguns inclusive nominados de empréstimo pessoal.
Abusividade na taxa de juros
Ao analisar o processo, o magistrado reconheceu a ilegalidade da operação.
"Por mais que a parte ré juntou os contratos celebrados entre as partes e que conste débito em conta ou empréstimo pessoal, configura operação típica de empréstimo consignado, e há imensa abusividade na taxa de juros aplicada em de 18% ao mês e 628,76% ao ano (nos termos do art. 39 e incisos do Código de Defesa do Consumidor)." No entendimento do juiz, foi oferecido o débito em conta como se fosse um empréstimo geral justamente para alcançar uma taxa de juros maior.
"Quanto ao pleito de dano moral formalizado pela autora, este merece prosperar na medida em que a requerida se trata de instituição financeira com forte estrutura técnico jurídica e financeira, o que pressupõe a ciência do ato ilegal praticado, qual seja a realização de contrato de empréstimo consignado de forma desvirtuada, visando obter lucro demasiado sobre pessoa, aposentada, hipossuficiente, beneficiaria do INSS."
Por esses motivos, determinou: que o banco adeque o contrato para a modalidade de empréstimo consignado, devendo haver o recálculo do saldo devedor e adequação dos juros à média do mercado; e que a financeira indenize a consumidora em R$ 15 mil.
Segundo a portaria, a regra de pagamento de juros de mora deverá ser aplicada a todos os casos pendentes de análise a partir de 10 de junho de 2021, data do início da vigência do acordo
Rio - Os benefícios concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) com atraso superior a três meses após a data do pedido terão incidência de juros. A medida foi publicada no Diário Oficial da União da quinta-feira passada, 30, por meio de uma portaria. Sendo assim, ela entrou em vigor na data de publicação.
A portaria segue um acordo aprovado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes em dezembro do ano passado, em que o INSS se comprometeu a respeitar um prazo de até 90 dias para dar um retorno sobre os pedidos de benefícios previdenciários.
Segundo o texto, a regra de pagamento de juros de mora deverá ser aplicada a todos os casos pendentes de análise a partir de 10 de junho de 2021, data do início da vigência do acordo. "O cálculo de juros não é aplicado nos casos em que há benefício indeferido, recurso, revisão, concessão judicial e benefícios de acordos internacionais", acrescenta.
O texto publicado na última semana determina que, "para aplicação dos juros de mora, a cada valor mensal gerado na concessão, será utilizado o índice mensal da caderneta de poupança divulgado pelo Banco Central do Brasil vigente na competência, somado aos índices dos meses posteriores até a DDB (data do despacho do benefício)".
A portaria prevê que os benefícios de auxílio por incapacidade temporária, auxílio-acidente, aposentadoria por incapacidade permanente e Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência não estarão sujeitos ao cálculo até 31 de dezembro de 2021. Além disso, não serão suspensos os prazos para os demais benefícios que contenham em suas etapas a avaliação social e perícia médica.
O texto determina, ainda, que o "índice será aplicado integralmente na renda mensal devida, independente da quantidade de dias de direito em cada mês". "O pagamento de juros de mora não afasta a obrigação do INSS de atualizar os valores gerados na concessão", completa a medida publicada no último dia 30.