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terça-feira, 13 de julho de 2021

O preço da infidelidade conjugal: Dano moral

 

Direito Civil

 - Atualizado em 


Nos termos do Código Civil no regime de casamento são deveres de ambos os cônjuges, entre outros, a fidelidade recíproca, que consiste na exclusividade de relacionamento sexual entre os cônjuges. Esse dever é quebrado com alguma relação sexual fora do matrimônio de qualquer dos consortes.

O conceito de fidelidade é a postura de quem é fiel, que assumiu um compromisso de preservar sua posição de maneira firme, constante e permanente, enquanto perdurar os termos convencionados.

De forma que, a traição conjugal potencializando outros valores que afetem à honra, a dignidade da pessoa, à sua reputação no meio social provocado por vexames ou constrangimentos, são elementos circunstanciais que embasam a viabilidade de reparação por dano moral à vítima daquela caboclada ou ursada.

É o que bem traduz Regina Beatriz (2013, pag. 71): O dever de fidelidade, o primeiro dos deveres mútuos entre os casados (art. 231, inciso I, do Código de 1916 e art. 1.566, inciso I, do Código Civil de 2002), pode ser conceituado como a” lealdade, sob o aspecto físico e moral, de um dos cônjuges para com o outro, quanto à manutenção de relações que visem satisfazer o instinto sexual dentro da sociedade conjugal”

A infidelidade conjugal tem repreensão na Bíblia quando no sétimo Mandamento prescreve: “não adulterarás” (Deuteronômio 5:18). A traição no casamento é um pecado muito sério, que destrói famílias. O casamento é uma aliança sagrada onde duas pessoas prometem ser fiéis um ao outro até a morte, perante Deus e os homens. A traição quebra essa aliança e desrespeita o cônjuge, os filhos e Deus. É um ato detestável a Deus.

O Código Civil versando sobre a reparação de danos, está assim precificada a reparação por dano moral:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

A infidelidade conjugal exprime a ruptura de um contrato social (casamento) no que se refere ao requisito da fidelidade, aviltando pela falta de boa-fé e dos bons costumes. Age com má-fé e contrário aos bons costumes. É uma ação voluntária violadora de um pacto que causa dor e sofrimento ao outros, presentes assim, os elementos ensejadores para a configuração do dever de reparação por dano moral.

Para Regina Beatriz Tavares da Silva o casamento: “Tem natureza monogâmica, com direitos e deveres de cunho jurídico, como a recíproca fidelidade, o respeito de um cônjuge pelo outro e a mútua assistência, no direito vigente e projetado”[1].

Em alguns casos é possível a aplicação do instituto do dano moral in re ipsa, ou seja, o dano moral presumido.

Tanto é que o Superior Tribunal de Justiça emitiu o informativo 17 9 sobre o dano moral presumido, in verbis:

Informativo 17 – O Dano Moral Presumido na Jurisprudência do STJ A possibilidade de reparação do dano moral presumido trata-se de uma exceção à regra geral, na medida em que a “indenização mede-se pela extensão do dano”, o qual deve ser certo – isto é, possível, real e aferível. Entretanto, em determinados casos a dimensão dos fatos são suficientes para se constatar que, de alguma forma, o indivíduo sofreu um abalo moral. Em tais situações, a doutrina defende que o dano moral é provado in re ipsa, ou seja, pela força dos próprios fatos, dispensando-se a vítima do ônus da prova da ofensa moral. Baseada nesse raciocínio, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem definindo as hipóteses em que o dano moral pode ser presumido. O mencionado dano moral in re ipsa decorre naturalmente do próprio fato e não exige comprovação para sua caracterização.

Sobre a temática, impende-se os seguintes Julgados:

DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS PELA OCULTAÇÃO DA VERDADE QUANTO À PATERNIDADE BIOLÓGICA. A esposa infiel tem o dever de reparar por danos morais o marido traído na hipótese em que tenha ocultado dele, até alguns anos após a separação, o fato de 101 que criança nascida durante o matrimônio e criada como filha biológica do casal seria, na verdade, filha sua e de seu “cúmplice”. De fato, a violação dos deveres impostos por lei tanto no casamento (art. 1.566 do CC/2002) como na união estável (art. 1.724 do CC/2002) não constitui, por si só, ofensa à honra e à dignidade do consorte, apta a ensejar a obrigação de indenizar. Nesse contexto, perde importância, inclusive, a identificação do culpado pelo fim da relação afetiva, porquanto deixar de amar o cônjuge ou companheiro é circunstância de cunho estritamente pessoal, não configurando o desamor, por si só, um ato ilícito (arts 186 e 927 do CC/2002) que enseje indenização. Todavia, não é possível ignorar que a vida em comum impõe restrições que devem ser observadas, entre as quais se destaca o dever de fidelidade nas relações conjugais (art. 231, I, do CC/1916 e art. 1.566, I, do CC/2002), o qual pode, efetivamente, acarretar danos morais. Isso porque o dever de fidelidade é um atributo de quem cumpre aquilo a que se obriga, condição imprescindível para a boa harmonia e estabilidade da vida conjugal. Ademais, a imposição desse dever é tão significativa que o CP já considerou o adultério como crime. Além disso, representa quebra do dever de confiança a descoberta, pelo esposo traído, de que a criança nascida durante o matrimônio e criada por ele não seria sua filha biológica. O STF, aliás, já sinalizou acerca do direito constitucional à felicidade, verdadeiro postulado constitucional implícito, que se qualifica como expressão de uma ideia-força que deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa humana (RE 477.554 AgR-MG, Segunda Turma, DJe 26/8/2011). Sendo assim, a lesão à dignidade humana desafia reparação (arts. 1º, III, e 5º, V e X, da CF), sendo justamente nas relações familiares que se impõe a necessidade de sua proteção, já que a família é o centro de preservação da pessoa e base mestra da sociedade (art. 226 CF). Dessa forma, o abalo emocional gerado pela traição da então esposa, ainda com a cientificação de não ser o genitor de criança gerada durante a relação matrimonial, representa efetivo dano moral, o que impõe o dever de reparação dos danos acarretados ao lesado a fim de restabelecer o equilíbrio pessoal e social buscado pelo direito, à luz do conhecido ditame neminem laedere. Assim, é devida a indenização por danos morais, que, na hipótese, manifesta-se in re ipsa. REsp 922.462- SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 4/4/2013 (Informativo nº 0522).

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS INDENIZAÇÃO – RELACIONAMENTO EXTRACONJUGAL – FILHO CONCEBIDO DURANTE O CASAMENTO – OMISSÃO QUANTO À INEXITÊNCIA DE VINCULO BIOLÓGICO COM O CÔNJUGE QUE O REGISTROU – VIOLAÇÃO AO DEVER CONJUGAL DE FIDELIDADE – DANO MORAL CONFIGURADO – INDENIZAÇÃO DEVIDA.

– A relação extraconjugal vivida pela ré e a omissão quanto à inexistência de vínculo biológico entre o autor e os filhos concebidos durante o casamento, que acreditava serem seus, evidenciam a quebra do dever conjugal de fidelidade previsto no inciso I do artigo 231 do Código Civil, então vigente à época da celebração do casamento das partes, que se repete no atual Código Civil, no inciso I de seu artigo 1.566.- É certo que o relacionamento extraconjugal pela ré causou ao autor abalo moral, pois atingiu a sua honra e os seus sentimentos mais íntimos relacionados à lealdade, sinceridade e de honestidade, que devem existir no casamento. Além de gerar angústia, desespero, indignação e incerteza quanto à manutenção do laço afetivo construído com os filhos, com os quais não possui vínculo biológico.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0245.09.169901-8/001, Relator(a): Des.(a) Leite Praça , 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/11/2013, publicação da súmula em 26/11/2013)

 

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VIOLAÇÃO AOS DEVERES MATRIMONIAIS. DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE FIDELIDADE, RESPEITO E LEALDADE. CÔNJUGE VIRAGO. RELAÇÃO EXTRACONJUGAL. DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA. FATO INCONTROVERSO. FILHO GERADO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. PATERNIDADE PRESUMIDA DO MARIDO. ELISÃO. EXAME DE DNA. OFENSA À HONRA E À REPUTAÇÃO DO CÔNJUGE. ABALO PISÍQUIICO INTENSO. SOFRIMENTO, DOR E DESGOSTO. DANO MORAL. QUALIFICAÇÃO. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA DEVIDA. QUANTUM. CONFORMAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA REFORMADA.

  1. Conquanto o rompimento duma relação afetiva resulte em transtornos de ordem psíquica, mormente para quem viu desfeitos sonhos inerentes ao projeto de felicidade projetado em companhia do consorte, a mera decepção amorosa gerada pelo desenlace não é passível de ser içada como fato gerador de dano moral afetando qualquer dos consortes, notadamente porque o desamor, a despeito de não desejado, é uma das vertentes previsíveis da vida conjugal, não consubstanciando por si só ato ilícito, e, ademais, eventual compensação pecuniária não pode ser transmudada em instrumento de cicatrização emocional.
    2. O descumprimento dos deveres matrimoniais inerentes à lealdade e fidelidade, por si só, não é apto a ensejar violação aos direitos de personalidade do cônjuge alcançado pela ofensa, podendo, contudo, irradiar obrigação indenizatória quando os fatos violadores se descortinem em cenário transgressor que, transbordando qualquer parâmetro de razoabilidade e previsibilidade, expõe demasiadamente o consorte ofendido, impondo-lhe, pela infidelidade e deslealdade, situação de dor íntima, vexame social e humilhação que extrapolam os limites toleráveis e minimamente compreensíveis e previsíveis no ambiente duma relação conjugal.3. Apreendido, de forma incontroversa, que criança germinada no pleno curso da vida conjugal não é filha biológica do marido, tendo germinado de relação extraconjugal mantida pela esposa, a par de encerrar gravíssima ofensa aos deveres inerentes ao casamento, implica violação gravíssima ao dever de lealdade que estava afetado à ex-consorte, que, ciosa do havido, mantivera-se silente face a razoável perspectiva de que a infante poderia ser fruto do relacionamento adulterino que mantivera ante a irregularidade da vida conjugal e das dificuldades que o casal enfrentava para a geração de herdeiros.4. A descoberta de que criança gerada no pleno curso da relação conjugal e assumida como filha biológica não derivara da descendência biológica do marido, tendo germinado de relação extraconjugal mantida pela ex-esposa, que, de sua parte, suprimira o fato até que viesse a ser descortinado anos depois do nascimento da infante e após a dissipação do vínculo, diante da enfermidade congênita que afeta o ex-consorte – oligospernia -, a par de descerrar as frustrações provenientes da falta de lealdade da primitiva cônjuge, implica gravíssima dor íntima ao vitimado pelo fato, ensejando-lhe, ademais, frustração, insegurança e constrangimento social, consubstanciando fato ofensivo aos direitos da sua personalidade, irradiando dano moral de substancial alcance por ter violado sua dignidade. 5. O dano moral, afetando os atributos da personalidade do ofendido e atingindo-lhe no que lhe é mais caro, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito e aferição de que é apto a impregnar reflexos em sua personalidade, prescindindo sua qualificação da germinação de efeitos materiais imediatos, inclusive porque se destina a sancionar o autor do ilícito e assegurar ao lesado uma compensação pecuniária como forma de atenuar as consequências que lhe advieram da ação lesiva que o atingira.
    6. A mensuração da compensação pecuniária a ser deferida ao atingido por ofensas de natureza moral deve ser efetivada de forma parcimoniosa e em conformação com os princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos e para o comportamento do ofensor e do próprio lesado em face do ilícito que o vitimara, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar alteração na situação financeira dos envolvidos, nem tão inexpressivo que redunde em uma nova ofensa ao vitimado, devendo o importe a ser arbitrado em estrito cotejo a esses parâmetros, às circunstâncias da espécie e aos efeitos germinados do havido. 7. Apelação conhecida e parcialmente provida. Sentença reformada. Maioria. Julgamento realizado na forma do artigo 942, § 1º, do NCPC. (TJDFT – Acórdão 937441, 20140110842537APC, Relator: ROMULO DE ARAUJO MENDES, , Relator Designado:TEÓFILO CAETANO, Revisor: TEÓFILO CAETANO, 1ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 20/4/2016, publicado no DJE: 3/5/2016. Pág.: 223-237)

[1] MONTEIRO, Washington de Barros & TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Curso de Direito Civil – Direito de Família. Volume 2. Edição 42ª. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 47.

Redação por Bóris Kalil

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