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sexta-feira, 9 de julho de 2021

A penhora se transmite ao novo imóvel adquirido com a venda do anterior em razão de dívida

 

Dir. Processual Civil

 - Atualizado em 


Se um bem de família pode ser penhorado para a satisfação de dívida relativa à compra dele próprio, o novo bem de família adquirido com o dinheiro recebido pela venda do primeiro também estará sujeito a penhora.

Com essa conclusão, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a um recurso especial que tentava afastar decisão do Judiciário que entendia como transmissível a condição de penhorabilidade de um imóvel de família.

Nesse sentido afirmou a d. relatora: “Desse modo, na espécie, não pode o devedor adquirir novo bem de família com os recursos provenientes da venda de bem de família anterior para, posteriormente, se furtar ao adimplemento da dívida contraída com a compra do primeiro, notadamente tendo em vista a máxima de que a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza. Em outras palavras, se o primitivo bem de família pode ser penhorado para a satisfação de dívida relativa ao próprio bem, o novo bem de família, adquirido com os recursos da alienação do primeiro, também estará sujeito à exceção prevista no inciso II do art. 3º da Lei n. 8.009/90”.

O acórdão ficou assim escrito:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. DÍVIDA RELATIVA AO PRÓPRIO BEM. EXCEÇÃO. TRANSMISSIBILIDADE. PRESUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1- Recurso especial interposto em 22/7/2020 e concluso ao gabinete em 4/5/2021.

2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a exceção à impenhorabilidade prevista no inciso II, do art. 3º, da Lei n. 8.009/90, se aplica, por sub-rogação, ao imóvel adquirido com os recursos oriundos da venda de bem de família originalmente penhorável; e b) é lícito, por simples presunção, assumir que os recursos provenientes da venda do bem de família objeto do contrato ora executado foram utilizados na aquisição de outro bem de família, de modo a permitir a penhora deste por dívida relacionada ao primeiro imóvel.

3- O inciso II do art. 3º da Lei n. 8009/90, na linha do que preceitua o §1º do art. 833 do CPC/2015, dispõe que a impenhorabilidade do bem de família não prevalece na hipótese de processo de execução movido “pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”.

4- Se o primitivo bem de família pode ser penhorado para a satisfação de dívida relativa ao próprio bem, o novo bem de família, adquirido com os recursos da alienação do primeiro, também estará sujeito à exceção prevista no inciso II do art. 3º da Lei n. 8.009/90.

5- Muito embora seja certo que a exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no inciso II do art. 3º da Lei n. 8.009/90 transmite-se ao novo bem de família adquirido, é imprescindível que se comprove que este, de fato, foi adquirido com os recursos da venda daquele.

6- É imperioso o retorno dos autos às instâncias ordinárias para que se verifique, não com fundamento em mera presunção, mas com base nas provas acostadas aos autos, se o imóvel cuja penhora se discute foi ou não adquirido com os recursos provenientes da venda do bem de família que figurava como objeto do contrato ora executado.

7- Recurso especial parcialmente provido.

(STJ – 3ª Turma -RECURSO ESPECIAL Nº 1.935.842 – PR (2021/0005404-8) – rela. Min. Nancy Andrighi – maio/2021).

Extrai-se do voto da relatora:

“7. Desse modo, a solução da controvérsia demanda que se verifique se a exceção à impenhorabilidade prevista no inciso II, do art. 3º, da Lei n. 8.009/90, se aplica, por sub-rogação, ao imóvel adquirido com os recursos oriundos da venda de bem de família originalmente penhorável.

  1. Nesse contexto, importa consignar que a impenhorabilidade do bem de família funda-se na consideração de que, em determinadas hipóteses, com o objetivo de tutelar direitos e garantias fundamentais, o legislador buscou prestigiar o interesse do devedor em detrimento dos interesses do credor (SHIMURA, Sérgio; GARCIA, Julia Nolasco. A impenhorabilidade na visão do Superior Tribunal de Justiça. Revista de Processo. vol. 305. ano 45. p. 175. São Paulo: Ed. RT, julho 2020).
  2. Com efeito, trata-se de garantia legal que visa resguardar o patrimônio mínimo da pessoa humana, valor esse que o legislador optou por preservar em contraposição à satisfação executiva do credor.
  3. No entanto, a regras que estabelecem hipóteses de impenhorabilidade estão longe de serem consideradas absolutas, como se observa da própria abolição, no CPC/2015, da expressão “absolutamente” prevista no antigo art. 649, caput, do CPC/1973.
  4. No que tange, especificamente aos bens de família, o próprio art. 3º da Lei n. 8009/90 estabelece uma série de exceções à impenhorabilidade.
  5. De fato, por mais valiosas que sejam as razões que justificam a impenhorabilidade do bem de família, a jurisprudência desta Corte Superior, de há muito, caminha no sentido de impedir deturpações do benefício legal, evitando que a referida garantia seja utilizada como artifício para frustrar a satisfação dos credores: “não se pode admitir que, sob a sombra de uma disposição legal protetiva, o devedor pratique atos tendentes a inviabilizar a tutela executiva do credor, o que implicaria o uso da lei para promover a injustiça e, com isso, enfraquecer, de maneira global, todo o sistema de especial proteção objetivado pelo legislador” (REsp 1575243/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 02/04/2018).
  6. Nesse contexto, o inciso II do art. 3º da Lei n. 8009/90, na linha do que preceitua o § 1º do art. 833 do CPC/2015, dispõe que a impenhorabilidade do bem de família não prevalece na hipótese de processo de execução movido “pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”.
  7. Em outras palavras, é penhorável o bem de família para satisfação de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição. Nesse sentido: REsp 90.330/SP, QUARTA TURMA, julgado em 24/06/1996, DJ 26/08/1996, p. 29695.
  8. A norma em apreço possui nítido caráter protetivo dos credores, impedindo comportamentos contrários à boa-fé objetiva, evitando a prática de fraudes e garantindo a segurança jurídica indispensável às relações jurídicas e econômicas”.

STJ

Foto: divulgação da Web

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