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sexta-feira, 24 de maio de 2013

ENUNCIADO 571 da VI Jornada de Direito Civil da Justiça Federal

Se comprovada a resolução prévia e judicial de todas as questões referentes aos filhos menores ou incapazes, o tabelião de notas poderá lavrar escrituras públicas de dissolução conjugal.

Artigos:
1.571 ao 1.582 do Código Civil, combinados com a Lei n. 11.441⁄2007

Justificativa:
A Lei n. 11.441⁄2007 prevê que somente é permitido aos cônjuges fazer uso da escritura pública de separação judicial ou divórcio se não houver interesses de menores ou incapazes.

Entretanto, entendemos que, se os interesses dos menores ou incapazes forem atendidos ou resguardados em outro processo judicial, é permitido aos cônjuges dissolver o vínculo matrimonial, inclusive com a partilha de bens e o uso do nome, sem que afete o direito ou interesse dos menores ou incapazes.

A Lei n. 11.441⁄2007 é uma importante inovação legislativa porque representa novo paradigma, o da desjudicialização, para as hipóteses e cláusulas em que há acordo entre os cônjuges.

Se há acordo quanto ao divórcio e se os interesses dos menores estão resguardados em lide judicial específica, não há por que objetar o procedimento simples, rápido, desjudicializado, que desafoga o Judiciário e dá resposta mais rápida às questões eminentemente pessoais.

Ao Judiciário será requerido somente o que remanescer da lide, sem que haja acordo, como também aqueles que contenham direitos e interesses dos menores ou incapazes. 
IRIB Responde - Compra e venda entre cônjuges. Regime matrimonial – separação obrigatória de bens.

PERGUNTA

Uma mulher solteira adquiriu um imóvel e está, atualmente, casada sob o regime da separação obrigatória de bens. Pretende vender este imóvel ao seu marido. É possível a celebração desta compra e venda?

Buscando um entendimento melhor do que pensamos sobre a questão em análise, julgamos de importância observar que o assunto em tela teve tratamento diferenciado quando comparamos o que tínhamos no Código Civil de 1916, com o que temos no agora em vigor, levando-nos a admitir como perfeitamente regular a transmissão de direitos sobre imóveis, até então pertencendo de forma exclusiva a somente um dos cônjuges, feita por este em favor do outro, o que não acontecia quando em vigor citado Código de 1916.

Melhor explicando:

No Estatuto Civil revogado, quando combinado o disposto no art. 256, com o em trato no de número 312, era manifesta a proibição de se pactuar a possibilidade de doações de um para outro cônjuge, quando o casamento ocorreu no regime da separação obrigatória de bens. Não obstante estar referido art. 312 a mencionar apenas o instituto da doação como defeso para quem casado no regime aqui reportado, a doutrina e jurisprudência dominante passou também a estender tal proibição para todas as demais formas de transmissão, ficando, assim, entendida a não possibilidade de qualquer tipo de alienação de um cônjuge para outro, se casados no regime imposto pela Lei, como da separação obrigatória de bens. Outro entendimento, ou seja, de permissão para que isso fosse feito, era visto como ato de burla ao que o legislador desejou no Código de 1916, ou seja, de que os direitos que um dos cônjuges tinha em determinado imóvel, não poderiam por qualquer ato "inter vivos" passar também para o domínio do outro.

Analisando o Código de 2002, não percebemos nenhum artigo na direção dos sobreditos 256 e 312, mostrando-nos, ao contrário, expressa permissão para a compra e venda entre cônjuges, de bens excluídos da comunhão, como se vê de seu art. 499, que, textualmente, indica a licitude de tal negociação. Acrescente-se ainda ao referido art. 499, como sustentação para a regularidade desse tipo de negócio jurídico, o que temos também no art. 1.639, do referido Código, que autoriza os nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

Observamos, ainda, que, além da possibilidade legal de tais transações ocorrerem durante o casamento, como aqui entendido, temos ainda mostras no Código vigente, de que tal permissão pode também ser objeto de pacto antenupcial, com proveito do disposto no art. 1.639, do mesmo Estatuto Civil, e com seu regular registro junto ao Oficial Imobiliário competente, como previsto no art. 178, inciso V, da Lei 6.015/73 se nota da redação do art. 1.639 e com regular registro junto ao Oficial Imobiliário competente.

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, recomendamos obediência às referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Seleção: Consultoria do IRIB
Fonte: Base de dados do IRIB Responde

Divórcio e separação consensuais em cartório com filhos ou menores incapazes

Rogério Tobias

Em vigor desde janeiro de 2007, a lei 11.441/07, que alterou dispositivos do CPC, permite que a separação e o divórcio sejam efetuados por meio de escritura pública lavrada por um Tabelião de Notas.
Salutar a medida de desjudicialização destes atos, pois proporciona rapidez ao casal separando ou divorciando, por meio de procedimento simples e rápido.
Sempre é necessária a assistência de um advogado ao casal na prática do ato, além da consensualidade das partes.
A atualização do capítulo XIV (Do Tabelionato de Notas) das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo (Tomo II – Cartórios Extrajudiciais) inovou, conforme disposto no item 86.1, ao prever a possibilidade de se promover a separação ou o divórcio em cartório de notas, mesmo havendo filhos menores ou incapazes do casal, o que até então não era permitido.
A exigência é que as questões referentes aos interesses dos filhos menores ou incapazes sejam resguardadas em lide judicial específica, tais como guarda, visitas e alimentos. Uma vez protegidos tais interesses na esfera judicial, pode ser feito o divórcio ou separação em um Tabelionato de Notas.
Restará, assim, ao Judiciário, apenas as separações ou divórcios em que haja lide ou que não tenham sido resolvidos judicialmente os direitos e interesses dos filhos menores ou incapazes.
Tal entendimento da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo foi adotado, também, pelo Centro de Estudos Jurídicos do Conselho da Justiça Federal recentemente, por meio do enunciado 571 da VI Jornada de Direito Civil da Justiça Federal, ocorrido nos dias 11 e 12/5 de 2013.
O procedimento no cartório colabora com novo paradigma, que é o da desjudicialização, pois a lavratura da escritura em um Tabelionato de Notas é procedimento simples, rápido e dinâmico, atendendo à sociedade de maneira eficaz.
O atendimento ao casal, que busca se separar ou divorciar, deve ser feito em sala ou ambiente reservado e discreto, com prévio aconselhamento sobre a seriedade ato e seus efeitos. O Tabelião deve agir como assessor imparcial das partes e verificar se, realmente, esse é o propósito do casal, pois, muitas vezes, escutar as partes pacientemente e um bom e firme aconselhamento sobre os efeitos decorrentes da separação e divórcio, especialmente se existirem filhos, evita a prática de atos impensados e desmotivados.
Havendo indícios de fraude à lei, de prejuízos a um dos cônjuges ou de dúvidas sobre o propósito de se separar ou divorciar, o ato deve ser recusado.
Para finalizar, toda a atividade do Tabelião de Notas deve ser sempre pautada pela prudência e acautelamento.
____________
* Rogério Tobias é representante do 2º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Jaú - SP.

Consumidores buscam a Justiça para defender seus direitos na compra de imóveis
O artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) permite que, no contrato de adesão, as cláusulas sejam estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu conteúdo. 
 
A regra vale para o contrato de compra e venda feito com construtora para aquisição de imóvel. Isso pode ser um problema para o consumidor – se este não conhecer seus direitos e, consequentemente, não souber identificar possíveis abusos por parte daquela. 
 
Em razão de problemas de natureza contratual ou do produto, a cada dia aumenta o número de demandas judiciais envolvendo construtoras. Confira a jurisprudência do STJ sobre o tema. 
 
Propaganda enganosa 
 
De acordo com o consultor jurídico do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), Rodrigo Daniel dos Santos, muitos não sabem que existe um documento – memorial de incorporação – que descreve todas as características do imóvel; inclusive detalhes como marca, tipo e modelo do piso, além da cor da tinta das paredes. 
 
Esse documento deve ser registrado no cartório antes da venda do imóvel. Com isso, aquele que estiver interessado em comprá-lo poderá verificar, antes de fazer o negócio, se todos os itens conferem com o constante no memorial. 
 
O consultor jurídico mencionou outro aspecto importante: a publicidade veiculada pelas construtoras faz parte do contrato. "Inclusive, se não houver ressalvas quanto a projeções artísticas com paisagismo e móveis em áreas comuns, estas são promessas que integram o contrato de venda." 
 
Sobre esse ponto, a Quarta Turma do STJ julgou um caso em que unidades residenciais do empreendimento denominado Meliá Barra Confort First Class, no Rio de Janeiro, de mais de R$ 2 milhões cada, foram vendidas como apart hotéis com serviços (REsp 1.188.442). 
 
Segundo o relator do recurso especial, ministro Luis Felipe Salomão, "o princípio da vinculação da publicidade reflete a imposição da transparência e da boa-fé nos métodos comerciais, na publicidade e nos contratos, de modo que o fornecedor de produtos ou serviços obriga-se nos exatos termos da publicidade veiculada". 
 
Atraso
 
Uma das queixas mais comuns enfrentadas pelo Judiciário é o atraso na entrega dos imóveis vendidos na planta. Vários casos já chegaram ao STJ. De acordo com dados do Ibedec, 95% das obras no Brasil são entregues com atraso. "Todos os contratos preveem uma cláusula, que reputamos ilegal, de tolerância de 180 dias na entrega do imóvel", afirmou Rodrigo Daniel dos Santos. 
 
Em setembro de 2011, a Terceira Turma do STJ decidiu que o atraso de três anos na entrega de um imóvel adquirido na planta não configurou dano moral. "A devolução integral das parcelas pagas, devidamente corrigidas, é suficiente para indenizar os prejuízos. Não há falar em indenização por dano moral na espécie", afirmou o ministro Massami Uyeda, relator do REsp 1.129.881. 
 
O contrato de compra e venda com a construtora, cujo objeto era um imóvel situado no Rio de Janeiro, foi celebrado em novembro de 1994, com entrega prevista para novembro de 1997. A cliente chegou a pagar mais de R$ 114 mil em prestações durante o tempo em que esperava pela entrega (que nem chegou a acontecer). 
 
Diante disso, moveu ação de rescisão contratual, cumulada com pedido de devolução integral das parcelas pagas, bem como indenização por danos moral e material. O juízo de primeiro grau julgou o pedido procedente, tanto em relação à rescisão, quanto à devolução das parcelas e ao dano moral – fixado em R$ 24 mil. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro reformou a sentença, apenas para afastar a condenação em lucros cessantes. 
 
Dano moral
 
No STJ, o ministro Massami Uyeda explicou que o consumidor está autorizado pelo ordenamento jurídico a buscar a rescisão contratual, bem como a devolução imediata dos valores pagos. Contudo, o ministro não concordou com as instâncias ordinárias em relação aos danos morais. 
 
Para ele, "salvo circunstância excepcional que coloque o contratante em situação de extraordinária angústia ou humilhação, não há dano moral. Isso porque, o dissabor inerente à expectativa frustrada decorrente de inadimplemento contratual se insere no cotidiano das relações comerciais e não implica lesão à honra ou violação da dignidade humana". 
 
Prazo para reclamar 
 
De acordo com Antônio Luiz da Câmara Leal, o prazo de prescrição somente se inicia com a ciência da violação do direito, não sendo admissível, portanto, que se tenha como extinta a pretensão antes mesmo desta ciência (Da Prescrição e da Decadência: Teoria Geral do Direito Civil). 
 
No julgamento do REsp 903.771, a Terceira Turma proferiu decisão nesse sentido. Para os ministros, o prazo que o dono do imóvel tem para ingressar em juízo contra a construtora, por danos relacionados à segurança e solidez da obra, começa a contar a partir da ciência das falhas construtivas. 
 
O imóvel adquirido em agosto de 1982 começou a apresentar problemas 17 anos depois. Em novembro de 2002 (mais de 20 anos após a aquisição), o morador moveu ação contra a construtora, na qual pediu indenização de danos materiais – visto que deixara de receber o valor correspondente aos aluguéis durante a reforma do prédio –, além de danos morais. 
 
O magistrado de primeiro grau reconheceu a prescrição vintenária da pretensão indenizatória. O Tribunal de Justiça de Sergipe desconstituiu a sentença, pois considerou que o prazo só começaria a contar a partir do conhecimento, pelo dono do imóvel, da fragilidade da obra. 
 
No recurso especial direcionado ao STJ, a construtora Celi alegou violação ao artigo 1.245 do Código Civil (CC) de 1916, segundo o qual, "nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo, exceto, quanto a este, se, não achando firme, preveniu em tempo o dono da obra". 
 
Garantia
 
De acordo com o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso especial, o prazo de cinco anos do artigo mencionado é de garantia e não de prescrição ou decadência. Isso quer dizer que, "desde que a fragilidade da obra seja conhecida nos cinco anos seguintes à sua entrega, possui ele [dono do imóvel], nos termos da Súmula 194 deste Tribunal, 20 anos para demandar o construtor". 
 
Entretanto, o ministro lembrou que existe alternativa à disposição do dono da obra, que independe de o conhecimento dos problemas de solidez e segurança ter-se dado nos cinco anos após a entrega: a comprovação da prática de um ilícito contratual, ou seja, da má execução da obra (artigo 1.056 do CC/16). 
 
"É inviável aceitar que o dono da obra, diante e no exato momento do conhecimento da fragilidade desta, seja impedido de veicular pretensão indenizatória em face de quem, culposamente, tenha ocasionado esta fragilidade", afirmou Sanseverino. 
 
Juros no pé
 
Um assunto que já gerou muita divergência de entendimento entre os membros das Turmas de direito privado do STJ é a cobrança de juros compensatórios antes da entrega das chaves do imóvel – os chamados "juros no pé". 
 
Em setembro de 2010, a Quarta Turma, em decisão unânime, negou provimento ao recurso especial interposto pela Queiroz Galvão Empreendimentos, por considerar que, "em contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção, descabe a cobrança de juros compensatórios antes da entrega das chaves do imóvel, porquanto, nesse período, não há capital da construtora mutuado ao promitente comprador, tampouco utilização do imóvel prometido" (REsp 670.117). 
 
Em junho de 2012, esse entendimento foi alterado pela Segunda Seção no julgamento dos embargos de divergência (EREsp 670.117) interpostos pela mesma empresa. Nas razões do recurso, a construtora alegou que havia decisão da Terceira Turma em sentido contrário: "Não é abusiva a cláusula do contrato de compra e venda de imóvel que considera acréscimo no valor das prestações, desde a data da celebração, como condição para o pagamento parcelado" (REsp 379.941). 
 
O ministro Antonio Carlos Ferreira, que proferiu o voto vencedor na Segunda Seção, citou vários precedentes do Tribunal que concluíram pela legalidade de cláusulas de contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção que previam a cobrança de juros compensatórios antes da entrega das chaves. 
 
Ele explicou que, em regra, o pagamento pela compra de um imóvel em fase de produção deve ser feito à vista. Contudo, o incorporador pode oferecer certo prazo ao cliente para o pagamento, por meio do parcelamento do valor total, que pode se estender além do tempo previsto para o término da obra. Para ele, isso representa um favorecimento financeiro ao comprador. 
 
"Em tal hipótese, em decorrência dessa convergência de interesses, o incorporador estará antecipando os recursos que são de responsabilidade do adquirente, destinados a assegurar o regular andamento do empreendimento", disse. 
 
Pagamento de aluguéis 
 
Ainda que a rescisão contratual tenha ocorrido por culpa da construtora (fornecedor), é devido o pagamento de aluguéis, pelo adquirente (consumidor), em razão do tempo em que este ocupou o imóvel. Esse foi o entendimento da Quarta Turma no julgamento do REsp 955.134. 
 
A dona de uma casa construída pela Só Casas Empreendimentos Imobiliários ajuizou ação contra a construtora, na qual sustentou que o imóvel teria sido entregue com atraso de mais de dois anos e com diversos defeitos que o tornaram impróprio para o uso. A empresa contestou os pedidos da autora e pediu que, em caso de rescisão contratual, ela fosse condenada a pagar aluguéis relativos ao período em que ocupou o imóvel. 
 
Em primeira instância, o contrato foi rescindido e a construtora foi condenada a restituir os valores recebidos, com correção monetária e juros. Contudo, o pedido da construtora (quanto aos aluguéis) também foi julgado procedente. Ambas apelaram e o Tribunal de Justiça de Santa Catarina reformou em parte a sentença. Para esse tribunal, somente seriam devidos aluguéis pela adquirente à vendedora se tivesse partido daquela o descumprimento contratual. 
 
Para o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso especial no STJ, independentemente de quem provocou a rescisão do contrato, é vedado o enriquecimento sem causa. "O pagamento da verba consubstancia simples retribuição pelo usufruto do imóvel durante determinado interregno temporal, rubrica que não se relaciona diretamente com danos decorrentes do rompimento da avença, mas com a utilização do bem alheio", afirmou. 
 
Cláusula abusiva
 
A Turma adotou outro entendimento importante nesse julgamento. Para os ministros, é abusiva a cláusula que estipula penalidade ao consumidor no caso de mora ou inadimplemento contratual, mas isenta o fornecedor em situações de análogo descumprimento contratual. 
 
O contrato de compra e venda previa, na hipótese de inadimplemento do consumidor, imposição de multa moratória, retenção de 5% a título de comissão de corretagem e de 2% a título de taxa de serviço. Segundo Salomão, "prevendo o contrato a incidência de multa moratória para o caso de descumprimento contratual por parte do consumidor, a mesma multa deverá incidir, em reprimenda ao fornecedor, caso seja deste a mora ou o inadimplemento". 
 
Ele mencionou que o artigo 4º do CDC estabelece os objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo, além de princípios que devem ser respeitados, como a harmonia e o equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores. "A par da exigência de que as relações entre consumidores e fornecedores sejam equilibradas, tem-se também como um direito básico do consumidor a igualdade nas contratações". 
 
Tamanho do imóvel
 
De acordo com a cartilha do consumidor produzida pelo Ibedec, "embora o apartamento seja vendido como unidade, o cálculo de seu preço é feito em metros quadrados, portanto qualquer diferença caracteriza vício e pode ser objeto de indenização". 
 
Em outubro de 2011, a Quarta Turma julgou recurso especial da empresa Paulo Octávio Investimentos contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que a condenou ao pagamento de indenização a um casal de clientes pela diferença de 1,45% na área do apartamento adquirido por eles (REsp 326.125). 
 
Segundo a ministra Isabel Gallotti, relatora, no caso de venda ad mensuram (quando o preço é estipulado por medida de extensão), "se as dimensões do imóvel vendido não correspondem às constantes da escritura de compra e venda, o comprador tem o direito de exigir a complementação da área, a resolução do contrato ou ainda o abatimento proporcional do preço". 
 
Contudo, ela explicou que existe uma ressalva no Código Civil. "Se a desproporção não exceder de um vigésimo da área total enunciada, presume-se que a referência às medidas foi meramente enunciativa, devendo ser tolerada a diferença." Quanto ao caso específico, a relatora observou que a diferença entre a área real do apartamento e a constante dos documentos apresentados pela construtora, de 5%, estava dentro da variação considerada tolerável pela legislação. 
 
Devolução
 
"Revela-se abusiva, por ofensa ao artigo 51, incisos II e IV, do CDC, a cláusula contratual que determina, em caso de rescisão de promessa de compra e venda de imóvel, a restituição das parcelas pagas somente ao término da obra", disse o ministro Luis Felipe Salomão, no julgamento do REsp 997.956. 
 
APL Incorporações e Construções recorreu ao STJ contra decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), o qual considerou ser nula a cláusula contratual que determinou a devolução das prestações pagas pelo comprador somente após a conclusão das obras. Além disso, o TJSC aplicou ao caso o artigo 1.096 do CC/16, segundo o qual, "salvo estipulação em contrário, as arras em dinheiro consideram-se princípio de pagamento. Fora esse caso, devem ser restituídas, quando o contrato for concluído, ou ficar desfeito". 
 
Segundo Salomão, relator do recurso especial, o STJ já tem jurisprudência pacífica sobre o assunto, que é contrária à pretensão da construtora. No julgamento do REsp 877.980, a Quarta Turma entendeu que a aplicação da cláusula configura enriquecimento ilícito por parte da incorporadora, visto que ela tem a possibilidade de revender o imóvel a terceiros e, ao mesmo tempo, obter vantagem com os valores retidos. 
 
Quanto à devolução da quantia paga a título de sinal, Salomão afirmou que é direito do comprador obter sua restituição, se ele não tiver dado causa à rescisão do contrato.
Atualizada em 22/05/13

CLÁUSULAS RECORRENTES EM CONTRATOS DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS NA PLANTA - ESTUDO DE CASO


I- INTRODUÇÃO

O presente parecer visa a examinar algumas cláusulas de um contrato de compra e venda de imóveis na planta, utilizando, para tanto, as normas constantes no Código Civil Brasileiro de 2002, os princípios que regem os contratos e a Lei nº 10.391/2004, que trata do patrimônio de afetação.
O caso, objeto desta análise, envolve cláusulas bastante comuns no dia-a-dia de quem compra bens imóveis na planta. Daí porque surge a necessidade de sermos juridicamente bem assistidos ao celebrarmos contratos com construtoras ou incorporadoras.
Para o estudo do caso, ilustramos algumas cláusulas recorrentes em contratos desta espécie, analisando-as sob a ótica do Direito Civil, visto que optamos privilegiar neste parecer a doutrina civilista, escapando de nossa pretensão adentrarmos na esfera consumeirista. Eis as cláusulas a que aludimos, encontradas em contratos desta espécie:
X.1 A VENDEDORA poderá pleitear, a seu exclusivo critério, concessão de financiamento à produção, o que implicará a outorga de garantias, conforme adiante mencionado.
X.1.1 A responsabilidade do pagamento do financiamento à produção é inicial e exclusivamente da VENDEDORA, podendo ser objeto de seu repasse (sub-rogação na pessoa do COMPRADOR).
X.2 Referida hipoteca ou alienação fiduciária abrangerá a totalidade do terreno e todas as unidades autônomas que integram o empreendimento, entre elas aquela ora compromissada à venda ao COMPRADOR.
X.3 Diante de todo o exposto, o COMPRADOR DECLARA SUA EXPRESSA CIÊNCIA dos fatos narrados pela VENDEDORA e sua EXPRESSA, IRREVOGÁVEL e IRRETRATÁVEL ANUÊNCIA à futura hipoteca ou alienação fiduciária que a VENDEDORA constituirá em favor do agente financiador para garantia do financiamento à produção, que inclusive compreenderá a unidade autônoma, ora compromissada à venda ao COMPRADOR.
X.4 Se necessário for, o COMPRADOR ratificará sua anuência, ora manifestada, no contrato de financiamento à produção.
X.5 Se e quando for assinado e registrado o contrato com o agente financiador, a VENDEDORA encaminhará cópia de seu inteiro teor ao COMPRADOR.

Desta feita, primeiramente, serão expostas as conclusões possíveis caso o contrato seja realmente celebrado por adesão. Aí serão aplicados os princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva ao caso concreto, ora apresentado. Depois, apresentarei as possíveis ambigüidades e/ou contradições presentes nas cláusulas, bem como tratarei sobre a existência de previsão do disposto no art. 424, do Novo Código Civil (renúncia antecipada do aderente ao direito resultante da natureza do negócio.
Por fim, pretende-se mostrar possíveis conseqüências em virtude da falência da vendedora, citando o advento da Lei 10.391/2004 que trouxe uma grande inovação no mundo jurídico imobiliário, qual seja, o patrimônio de afetação. Este, conforme veremos a seguir, tranqüilizou pessoas que evitavam compra imóveis na planta desde o advento da falência da ENCOL.
II – POSSÍVEIS CONSEQÜÊNCIAS CASO O CONTRATO EM QUESTÃO SEJA CELEBRADO POR ADESÃO
Normalmente, quando duas pessoas, jurídicas ou privadas, desejam celebrar contratos discutem livremente as cláusulas e, aceitando-as, assinam o ajuste.
Ocorre que, em virtude de uma demanda exorbitante de contratos semelhantes que muitas empresas pactuavam, dentre elas, bancos, construtoras, etc., adveio o contrato de adesão, cuja liberdade das partes é bem minimizada.
Segundo exposição de Orlando Gomes (1972, p. 3):
“Contrato de adesão é o negócio jurídico no qual a participação de um dos sujeitos sucede pela aceitação em bloco de uma série de cláusulas, formuladas antecipadamente, de modo geral e abstrato, pela outra parte, para constituir o conteúdo normativo e obrigacional de futuras relações concretas.”
A explicação deste mestre é perfeita no sentido de que, de fato, as partes não discutem cláusulas, que são pré-formuladas pela empresa contratada. Elas apenas aderem ao que já está escrito, submetendo-se, algumas vezes, a aberrações jurídicas, que já são objeto de nulidade.
Ressalte-se que, as cláusulas de um ajuste, enquanto o contrato não for aderido por algum comprador, ainda não configura contrato de adesão, recebendo, tão-somente, a denominação de condições gerais. Estas só passam a ter eficácia jurídica quando existe a adesão por parte do comprador.
No caso em tela, por exemplo, as cláusulas expostas para análise, são bastante comuns em contratos de compra e venda de imóveis que são objeto de uma incorporação e posterior construção.
Desta feita, aderindo o comprador ao contrato, as conclusões poderão ser as mais variadas possíveis, dependerá de como as partes se comportarão ao longo da construção, ou seja, se cumprirão as cláusulas contratuais.
Ab initio, vislumbra-se nas cláusulas violação aos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, na medida em que impõe ao comprador obrigações capazes de lesá-lo ou de ferir o seu direito. Vejamos, senão, o que dispõem os arts. 421 e 422, do Código Civil:
Art. 421 - A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.
Art. 422 - Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Segundo o princípio da função social dos contratos, o contrato deve ser útil ao interesse público, ou seja, ainda que a autonomia da vontade das partes tenha que ser respeitada, esta nunca poderá prevalecer em relação à ordem social mais justa. Ao Poder Judiciário caberá contratar o conteúdo contratual sempre que este violar a função social exigida pela lei.
Para reforçar o disposto no art. 421, do Código Civil, o art. 2035 do mesmo Código dispõe que “nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos”.
Para Paulo Lobo, o referido princípio “determina que os interesses individuais das partes sejam exercidos em conformidade com os interesses sociais, sempre que estes se apresentem”.
Analisando as cláusulas do contrato de compra e venda de imóveis, verificam-se possibilidades de o comprador vir a ser prejudicado por força da cláusula. Por exemplo, na X.3, a compradora declara expressa, irrevogável e irretratável anuência às garantias constituídas em favor do financiamento bancário, sendo que uma delas é a hipoteca ou a alienação fiduciária da sua própria unidade. Se, porventura, o comprador terminar de pagar o imóvel antes que a construtora quite o agente financiador e, portanto, cancele a hipoteca, ele não poderá obter a propriedade do bem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
A primeira parte desta mesma cláusula também padece de legalidade no momento em que obriga o comprador a declarar sua expressa ciência dos fatos narrados pela vendedora. A referida cláusula é conhecida por “cláusula de presunção de conhecimento” e impede que, em uma ação que conteste a cláusula, o ônus da prova seja invertido.
Outra cláusula que representa claramente a ofensa ao princípio da função social dos contratos é a X.2 que dispõe que a hipoteca ou a alienação fiduciária abrangerá a totalidade do terreno e de todas as unidades autônomas que integram o empreendimento.
Se a garantia dada ao financiamento firmado entre agente financiador e a incorporadora for a hipoteca, a referida cláusula é nula, pois, conforme a Súmula 308, do STJ: “ A hipoteca firmada entre construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”.
A referida Súmula ensejou inúmeros benefícios àqueles compradores de imóveis na planta, cujo contrato continha cláusulas como a X.2. É que quando a incorporadora não pagava o financiamento, restava ao comprador a responsabilidade de quitar o mencionado débito.
Por conta disto, o STJ entendeu que a hipoteca não seria válida, sob o fundamento de que:
“regras gerais sobre hipoteca não se aplicam no caso de edificações financiadas por agentes imobiliários integrantes do sistema financeiro de habitação, porquanto estes sabem que as unidades a serem construídas serão alienadas a terceiros, que responderão apenas pela dívida que assumiram com o seu negócio, e não pela eventual inadimplência da construtora”.
Se a garantia dada for a alienação fiduciária, não existe norma ou decisão que trate o caso da mesma forma que a Súmula 308, do STJ. Nesse caso, se houver inadimplência por parte da incorporadora, o banco terá a propriedade do bem? Esta é mais uma incerteza no mundo jurídico da compra e venda de imóveis na planta.
Diante disso, percebe-se que se esse mesmo contrato for aderido por várias pessoas, como normalmente acontece, as cláusulas “abusivas” passam a se disseminar entre outros adquirentes, o que poderá acarretar prejuízos a várias pessoas. Onde fica, então, o interesse social?
A boa-fé objetiva também é violada neste contrato no momento em que neste constam cláusulas preestabelecidas, capazes de lesar a parte compradora, consoante visto acima. Orlando Gomes, mais uma vez, declara que “ao princípio da boa-fé empresta-se ainda outro significado... que as partes devem agir com lealdade e confiança recíprocas.”
Todas as cláusulas retromencionadas são exemplos de violação da boa-fé objetiva. A X.1.1, por exemplo, a ofende quando dispõe que a responsabilidade pelo financiamento da construtora poderá ser repassado ao comprador. A referida declaração é, além de tudo, ambígua, conforme veremos na próxima questão. A X.2 quando o vendedor, ao impor ao comprador uma cláusula contrária a entendimento dos Tribunais Superiores, vai de encontro com um comportamento probo e leal.
Vejamos, senão, o que aduz o Egrégio Superior Tribunal de Justiça ao tratar da teoria da lesão do contrato:
“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ART. 535, II, DO CPC. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. ART. 460, DO CPC. SENTENÇA EXTRA PETITA. INEXISTÊNCIA. ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA E CONTRATO DE MÚTUO. NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. CONJUNTO HABITACIONAL PARQUE DOS COQUEIROS/RN. SÚBITA ELEVAÇÃO DE PREÇO DAS UNIDADES  HABITACIONAIS. SÚMULAS 05 E 07/STJ. 1.  Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 2. Inocorre violação do art. 460 do CPC se o aresto recorrido decide a lide nos limites do pedido formulado. 3.A lesão parcial do contrato determina a retirada da cláusula representativa do vício, in casu, consistente em aumento de 47%, desconhecido dos mutuários  e abusivo. ( Precedentes da Corte). 4. A teoria da lesão do contrato incide quando um dos contratantes é levado à realização de avença que lhe seja excessivamente desfavorável, o que em regra ocorre nos contratos de adesão, em que uma das partes é destituída da liberdade de estipular o conteúdo do contrato, como sói ocorrer com o mútuo oneroso. 5. A aferição da violação dos dispositivos apontados como infringidos impõe cognição fática, o que esbarra  nas Súmulas 5 e 7 deste Eg. STJ. 6. Recurso especial não conhecido.”
A violação de princípios como os que foram tratados acima ensejam o desequilíbrio das relações contratuais. O equilíbrio estabelece-se quando um dos contratantes não aufere vantagem manifestamente excessiva em relação ao outro, permanecendo firme o ideal de justiça que envolve nosso ordenamento jurídico.
Posto isto, não restam dúvida de que, ao assinar o contrato com as cláusulas, ora analisadas, o comprador poderá estará aderindo obrigações e anuindo atitudes que violam princípios basilares do Direito Contratual.

III-AMBIGUIDADES E/OU CONTRADIÇÕES PRESENTES NAS CLÁUSULAS

Diz o art. 423, do Código Civil Brasileiro que “quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente”.
Analisando as cláusulas do contrato de compra e venda de imóveis na planta, verifica-se que existem ambigüidade e contradição em seu bojo. Tal fato acontece na cláusula X.1.1 que trata da responsabilidade pelo pagamento do financiamento à produção, cuja redação é “a responsabilidade do pagamento do financiamento à produção é inicial e exclusivamente da vendedora, podendo ser objeto de repasse (sub-rogação na pessoa do comprador)”. E, ainda que, além desses defeitos, em minha opinião, esta cláusula apresenta omissão ao deixar de informar em que casos haverá a subrogação da responsabilidade da pessoa do comprador. Vejamos:
A contradição é percebida logo no início da cláusula quando responsabiliza exclusivamente o vendedor pelo pagamento do financiamento e depois afirma que este poderá ser repassado ao comprador. A contradição deve ser interpretada de modo a beneficiar o adquirente e aderente, ou seja, a pagamento do financiamento deverá limitar-se tão-somente ao vendedor.
Verifica-se a ambigüidade com a possibilidade do repasse ao comprador. Mas repasse de quê? A cláusula não deixou claro isso, possibilitando, assim, dupla interpretação.  A primeira no sentido de que o comprador ficará responsabilizado pelo pagamento do financiamento e a segunda no sentido de que, em caso de não pagamento da Construtora, o valor do contrato pago pelo comprador será repassado diretamente para a Construtora. Esta última interpretação é o que conhece por cessão de créditos.
Com uma simples leitura do texto, parece que a interpretação da cláusula é a primeira, qual seja, a de que o comprador ficará responsabilizado pelo pagamento do financiamento. Entretanto, a interpretação mais favorável ao aderente é a segunda, devendo, portanto, esta ser aplicada ao caso concreto.

IV-EXISTÊNCIA, NAS CLÁUSULAS, DE PREVISÃO DE RENÚNCIA ANTECIPADA DO ADERENTE AO DIREITO RESULTANTE DA NATUREZA DO NEGÓCIO.

Segundo Arnaldo Rizzardo (2005, p.107), “não são válidas as cláusulas que impõem a renúncia antecipada de qualquer direito; as que limitam o emprego de medidas judiciais; as desvantajosas e as leoninas. Nem surtem efeitos as que encerrem falta eqüidade nas prestações e limitam a perspectiva de futura discussão”.
Analisando as cláusulas do contrato de compra e venda de imóvel na planta, verificam-se que a X.2, a X.3 e a X.4 se coadunam com o disposto no art. 424, do Código Civil Brasileiro, que diz que “nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”.
A X.2, conforme verificado acima, refere-se à garantia do financiamento pactuado entre a incorporadora e o agente financeiro. Segundo a cláusula, essa garantia incidirá sobre o terreno e as unidades autônomas. Na segunda parte da X.3, a compradora declara sua expressa, irrevogável e irretratável anuência à futura garantia.
Considerando estas cláusulas em conjunto, percebe-se que elas são desvantajosas para o comprador por vários motivos. Se, porventura, a incorporadora inadimplir o contrato de financiamento, o imóvel do comprador garantirá a dívida, ainda que ele já esteja totalmente quitado perante a construtora.
Se o imóvel ainda não estiver quitado por parte do comprador, da mesma forma a sua unidade autônoma ou fração ideal (se o imóvel não foi construído) garantirá o débito.
Em virtude de tais fatos é que o Superior Tribunal de Justiça “A hipoteca firmada entre construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”.
A referida Súmula ensejou inúmeros benefícios àqueles compradores de imóveis na planta, cujo contrato continha cláusulas como a X.2. É que quando a incorporadora não pagava o financiamento, restava ao comprador a responsabilidade de quitar o mencionado débito.
Por conta disto, o STJ entendeu que a hipoteca não seria válida, sob o fundamento de que:
“regras gerais sobre hipoteca não se aplicam no caso de edificações financiadas por agentes imobiliários integrantes do sistema financeiro de habitação, porquanto estes sabem que as unidades a serem construídas serão alienadas a terceiros, que responderão apenas pela dívida que assumiram com o seu negócio, e não pela eventual inadimplência da construtora”.
Diante dos comentários acima realizados, verifica-se completa nulidades das cláusulas X.2 e X.3, parte final.
A parte inicial da cláusula X.3 também viola o disposto no art. 424, do CC ao impor ao comprador a declaração de sua expressa ciência dos fatos narrados pela vendedora ao longo contrato. Essa cláusula costuma estar em muitas avenças e comumente denominada de cláusula de presunção de conhecimento.
Não obstante sua freqüência dos contratos, ela deve ser considerada nula por estipular renúncia antecipada do comprador de discutir posteriormente as cláusulas em juízo. Conforme entendimento de Arnaldo Rizzardo (2005, p.107):
“A ninguém se permite decidir por outrem um direito pessoal, nem assumir compromisso de eterna validade de cláusulas contratuais. Os beneficiários ou sucessores não são obrigados a acatar a deliberação do contratante, coisa que a este se comina, pois imprevisível o futuro, embora tenha renunciado o direito de impugnar possíveis alterações do estatuto”.
Diante do exposto, conclui-se que as cláusulas, ora analisadas, são nulas em virtude de o contrato ensejar desvantagens e renúncia antecipada a direito resultante da natureza do negócio ao comprador.

V- FALÊNCIA DA VENDEDORA E PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO

Primeiramente, é imprescindível iniciar este tópico apresentando o conceito de incorporação imobiliária como ”a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas”.
O caso, ora analisado, trata-se de um típico caso de incorporação imobiliária, onde o vendedor, incorporador/construtor, celebra contrato de compra e venda de imóvel com o comprador, cujo objeto é a fração ideal que corresponderá a uma unidade autônoma.
Assim, quando uma construtora deseja realizar um empreendimento imobiliário destinado à venda das frações ideais, ela deve, antes de lançá-lo, registrar a incorporação na matrícula do imóvel no Ofício de Registro de Imóveis competente. Para tanto, deve anexar a Serventia uma série de documentos que comprovem a idoneidade do incorporador. Uma vez registrada a incorporação é que serão iniciadas as vendas aos possíveis adquirentes.
Não obstante ser esta uma prática corriqueira no mercado e que dá certa segurança para quem está adquirindo o imóvel, muitas vezes a incorporadora, que muitas vezes é a mesma construtora, entrava em processo de falência. A massa falida da empresa arrecadava o empreendimento, isto é, todo o patrimônio dos adquirentes das futuras unidades imobiliárias.
Em virtude disso é que, em 2 de agosto de 2004, foi editada a Lei nº 10.931, a qual regulamentou o patrimônio de afetação, cujo conceito, a opinião de Chahub (2003, p.81), é “uma universalidade de direitos e obrigações destinada ao cumprimento de determinada função, que opera integrada com o patrimônio geral”.
Na incorporação imobiliária, a função do patrimônio de afetação é dar segurança aos compradores em relação à conclusão e entrega da obra, respondendo pelo resultado com o patrimônio geral. Segundo Pedro Elias Avvad (2006, p.599):
“O lucro que vier a ser apurado com a incorporação, uma vez liquidado o patrimônio de afetação, atendimento dos direitos e obrigações, pertence ao incorporador. Se não for suficiente o patrimônio de afetação, o incorporador terá que extrair bens de seu patrimônio geral para atender aos compromissos decorrentes da construção das unidades”.
De fato, não há dúvida da segurança jurídica que os adquirentes de imóveis comprados na planta têm desde o advento desta nova Lei.
Somente a título de curiosidade, Pedro Elias Avvad (2006, p. 601) acrescenta que:
“O incorporador pode segregar o patrimônio antes de começar a negociar as unidades, fazendo-o logo que arquivado o memorial de incorporação do Registro de Imóveis, passando, então, o terreno, as acessões, as receitas provenientes de vendas das unidades a formar um núcleo patrimonial que, embora pertencente ao patrimônio geral do incorporador, tem autonomia e individualidade próprias”.
Desta feita, estando a incorporação devidamente registrada na matrícula do imóvel e havendo falência da incorporadora, o patrimônio de afetação não será arrecadado pela massa falida, podendo a obra ser concluída com os recursos existentes ou com os pagos pelos adquirentes.
Não obstante todos os comentários acima mencionados acerca das vantagens trazidas com advento do patrimônio de afetação, este instituto ainda não é unanimidade entre as incorporadoras, pois muitas fazem o empreendimento sem formalizá-lo. Nesse caso, se a empresa vai à falência, a obra poderá continuar, desde que os próprios adquirentes assumam o “problema”, formando uma Comissão de Representantes e contratando uma nova construtora (caso a incorporadora falidas seja a mesma construtora) para continuar a obra.

VI - CONCLUSÃO

Neste parecer foram analisadas algumas cláusulas retiradas de um contrato de compra e venda de imóveis de acordo com as normas do Código Civil Brasileiro e a Lei que instituiu o patrimônio de afetação.
Primeiramente, foram expostas algumas conclusões caso o comprador aderisse às cláusulas, ora estudadas. Vislumbrou-se aí a violação aos princípios da boa-fé, da função social do contrato e do equilíbrio contratual.
Depois foi analisada a presença de cláusulas ambíguas e contraditórias, bem como aquelas de declaram renúncia antecipada a direito que resulte do próprio contrato.
Por fim, foram elencadas as possíveis conseqüências decorrentes da falência da empresa vendedora. Nesse momento, apresentou- se o conceito de patrimônio de afetação, suas características e a relação entre este instituto e o caso, ora analisado.
 
Autor: Leonardo Ayres Santiago Assistente Jurídico da Presidência do TRT/RJ - Analista Judiciário; Especialista em Direito da Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense e em Direito Processual Civil pela UVA; Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Fonte: Revista Âmbito Jurídico

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Charge de Gerson Kauer

Ernesto era um "bon vivant". Corretor de seguros, tinha uma agenda de modestos mas fiéis clientes e também de múltiplas parceiras para as tarefas de cama, com as quais costumava, em sistema de rodízio, festejar as sextas-feiras.

Um dia, para atingir a quota de produção que, pelo volume mensal, lhe garantiria um bônus salarial extra na seguradora, Ernesto contratou, como segurado, um seguro de vida para si mesmo. O capital segurado era modesto: R$ 14.900. Solteiro e sem nenhuma relação estável definida como exclusiva, ele nominou como beneficiária simplesmente "a esposa". 

De repente, Ernesto sofreu um infarto que o levou embora da vida terrena. Poucos dias depois,  três postulantes "esposas" se apresentaram na seguradora - todas documentadas levando flashes da vida em comum: fotografias, notas de hotéis de uma estrela etc. E contas de luz, água e telefone em nome dele, Ernesto - com três endereços diferentes.

O diretor da seguradora não escondeu a estupefação. Já tinha visto "matriz" e "filial" discutirem por indenizações securitárias. Ou até mesmo duas - e simultâneas - concubinas. Mas três companheiras brigando por "uma micharia de menos de R$ 15 mil" era inédito e também um risco. Afinal, pagar para quem?

O Jurídico da seguradora optou por uma ação de consignação em pagamento contra as três pretendentes. O juiz sentenciou pelo pagamento integral em favor de uma - a que mantivera a "relação estável por mais tempo". Só a segunda das três apelou. Mesmo sem recurso das demais partícipes do bolo, a Câmara Cível do TJRS foi salomônica:

Proponho que mandemos dividir o dinheiro por três - sugeriu o relator.

Mas o vogal e a juíza convocada empacaram num aspecto processual: como fazer a divisão de 33,33% para cada das companheiras, se uma delas se conformara com a sentença que nada lhe destinara?

- Sejamos criativos, façamos a nossa parte, talvez o Criador faça a sua - insistiu o relator, conhecido pelo seu coração de bom juiz.

Os outros dois desembargadores concordaram. E assim foi lavrado o acórdão.  Dois meses depois, as três contempladas ingressaram juntas na agência forense do Banrisul, cada qual com seu alvará na mão, para sacarem individualmente R$ 4.966 mais rendimentos.

A gente já adivinhava que ia dar nisso e que o Ernesto nunca iria nos deixar mal - disse a mais jovem das três.

Todas sairam felizes, dinheiro na mão, comemorando que o Ernesto sempre tinha sido "um homem bom em tudo". Elas sairam a passo, atravessaram a avenida e foram numa igreja próxima rezar pela alma do finado. 

terça-feira, 21 de maio de 2013


PENDÊNCIA ZERADA

BB deve indenizar por recusar crédito a ex-inadimplente

O banco não pode manter indefinidamente ativo o registro negativo de cliente inadimplente, principalmente quando ele não está mais nesta condição por ter quitado a sua dívida de forma negociada. Logo, a manutenção do seu nome no cadastro, com a consequente recusa em conceder-lhe crédito, fere dispositivos do Código de Defesa do Consumidor e gera indenização por dano moral. Com base nesta linha de entendimento, a 2ª Câmara Especial Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou sentença e condenou o Banco do Brasil a pagar R$ 2.500 a um consumidor da Comarca de Taquari.
Os desembargadores reconheceram que a instituição financeira não é obrigada a fornecer crédito de forma indiscriminada. Entretanto, a recusa em contratar com o tomador deve estar justificada.
No caso concreto, o colegiado entendeu que o Banco do Brasil aceitou negociar o passivo com o consumidor inadimplente, zerando a pendência e, posteriormente, lhe negou crédito. ‘‘Diante da liquidação da dívida operada pela instituição financeira, o status jurídico do apelante (consumidor) se modificou. Ele deixou de ser correntista inadimplente para readquirir nova posição contratual junto apelado (banco)’’, afirmou o relator da Apelação no TJ-RS, desembargador Marcelo Cezar Müller. O acórdão foi assinado no dia 28 de março.
O caso
Em 2010, o autor foi até a agência do Banco do Brasil onde tem conta corrente e solicitou empréstimo no valor aproximado de R$ 1 mil. O banco recusou. Motivo: existência de uma pendência financeira com origem em contrato firmado em 30 de junho de 1999, no valor de R$ 58,27, referente a uma conta corrente aberta em 1996.
Como o banco não recuou de sua posição, o autor ingressou em juízo com Ação Declaratória de Inexistência de Débito, cumulada com pedido de indenização de 40 salários mínimos, a título de danos morais. Em síntese, sustentou que não tem responsabilidade pelo débito apontado. Requereu a antecipação de tutela, para impedir que o banco inscrevesse seu nome nos órgão de consulta de crédito, como o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC).
Após a concessão da tutela, o Banco do Brasil foi citado e apresentou contestação. Disse que a dívida era R$ 189,86 e que foi sendo amortizada pelo autor, mas não totalmente extinta. Sustentou que o débito remanescente não gerou repercussão externa ao autor, o que poderia ser utilizado como impeditivo a novas contratações de crédito. No entanto, alegou ser lícito manter as informações em nível interno. Afinal, agiu no exercício regular do seu direito, pois detém a liberdade de contratar com quem quiser.
Débito em jogo
A juíza Cristina Margarete Junqueira, titular da 1ª Vara Judicial da Comarca de Taquari, julgouimprocedente a demanda. Ao expor suas razões, ela se concentrou, primeiramente, na alegação de inexistência de débito, considerada ‘‘controversa’’.
De acordo com a juíza, os documentos trazidos ao processo mostram que foi concedido um crédito ao autor, que culminou com a parcela no valor de R$ 189,96 e que, no entanto, não foi adimplido integralmente. O autor fez amortizações nos valores de R$ 90,00, R$ 29,45 e R$ 29,00, mas que não foram suficientes para saldar a totalidade do débito. Destacou, ainda, que o débito permaneceu ativo por quase quatro anos, sem que fosse efetivado qualquer outro depósito por parte do autor. O débito foi transferido, então, para uma espécie de conta de perdas, de prejuízos. E o registro foi mantido apenas internamente.
‘‘O requerido (banco) apenas absteve-se de formular cobrança formal da diferença, mantendo tais valores em cota apropriada, a fim de que fosse contabilizado como perdas da instituição financeira e, por evidente, servissem de critério restritivo da conclusão de outros contratos com a mesma parte’’, deduziu a magistrada.
Nesta linha, a juíza entendeu que não é possível obrigar o banco a contratar com o autor quando há justificativa legítima para a sua recusa, notadamente o histórico da relação jurídica mantida entre as partes, que indica conduta inadimplente. ‘‘Tudo leva a crer que o demandante (autor) tende a cavar subterfúgios para auferir valores, sem que tenha que desempenhar esforços, refugiando-se sob o manto de aventado dano moral, que sequer restou comprovado nos autos, desvirtuando o instituto da responsabilidade civil’’, afirmou ela, revogando a liminar concedida e sepultando a pretensão.
Boa fé contratual
Ao interpor Apelação no Tribunal de Justiça, o autor afirmou que o extrato juntado aos autos comprova que, em julho de 1999, não havia débitos em sua conta. Portanto, a instituição financeira não poderia ter-lhe negado o empréstimo solicitado. Não houve contrarrazões.
O relator do recurso na 2ª Câmara Especial Cível, desembargador Marcelo Cezar Müller, acolheu a tese do apelante, detalhando suas razões no acórdão. A exemplo da julgadora de primeiro grau, ele se deteve na questão da existência, ou não, do débito.
‘‘O documento de fl. 56, no qual consta o ano de 2003, indica que o saldo da operação relativo à conta-corrente n. 23.895-5, efetuada entre as partes, é zero. E a explicação para a dívida estar zerada é obtida nas próprias razões do banco apelado (contestação, fls. 36-7). Ou seja, o apelante realizou alguns pagamentos para amortizar a dívida e foi beneficiado por um abatimento negocial (fl.56), que acabou liquidando o débito do autor perante o banco. Porém, não obstante ter considerado liquidado o débito, o banco admite manter restrições internas quanto ao nome do apelante (fl. 36), as quais aparecem comprovadas pelo extrato que o autor juntou à fls. 11 e 13’’, detalhou Müller.
Neste cenário, destacou, a recusa apresentada pela instituição financeira revela-se paradoxal, pois, ‘‘ou bem o banco considera que existe uma dívida, movimenta-se para cobrá-la e encerra o assunto, ou — como verificamos nesse caso — concede abatimento negocial e liquida a dívida’’. Para ele, foi um comportamento contraditório liquidar uma dívida, seguir mantendo o contrato de conta corrente e, depois, negar um empréstimo com base numa pendência já sepultada. Afinal, como a liquidação da dívida ocorreu há mais de cinco anos, o banco perdeu a prerrogativa de utilizar a pendência negociada com o autor como informação negativa para futuros contratos.
Ao fim e ao cabo, o relator entendeu que a conduta do banco feriu a boa fé objetiva e rompeu a estabilidade da relação contratual. Isso porque as partes definiram as expectativas contratuais no instante em que o banco considerou extinta a pendência e renovou o contrato de conta corrente. Neste aspecto, a conduta ilícita está expressa nos moldes dos artigos 187 e 927, do Código Civil de 2002; e nos artigos 14 e 43, parágrafo 1º do Código de Defesa do Consumidor.
Pela persistência dos efeitos negativos de uma pendência financeira por mais de cinco anos, o banco também desrespeitou a regra do artigo 43, parágrafo 3º, CDC. Assim, ele justificou os pedidos de declaração de inexistência da dívida e de indenização por dano moral — valor arbitrado em R$ 2,5 mil.
O voto foi seguido, por unanimidade, pelos desembargadores Marco Antonio Angelo (presidente do colegiado) e Lúcia de Fátima Cerveira.