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terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Corretora de câmbio responde por calote de agência de turismo na venda de moeda

 

Publicado em 09/02/2021 , por Danilo Vital

A corretora de câmbio assume a inteira responsabilidade pelo atendimento prestado aos clientes e usuários por seu correspondente contratado.

Com esse entendimento, a juíza Oriana Piske, do 4º Juizado Especial Cível de Brasília, condenou solidariamente uma agência de turismo e uma corretora de câmbio a indenizar por danos morais um cliente que comprou moeda estrangeira com promessa de entrega futura, mas não a recebeu.

 

A compra foi feita diretamente na agência de turismo, em um shopping de Brasília. O cliente depositou R$ 4,5 mil para garantir mil euros, que retiraria um mês e meio depois. Na véspera da data acordada, foi informado de que a entrega não seria feita.

O caso se desdobrou em longo período de negociações pela devolução do dinheiro. Sem acordo, o cliente processou a agência de turismo, mas também a corretora. Havia entre elas um contrato de correspondente cambiário.

Ao juízo, a corretora apontou que não tem nenhuma responsabilidade pela venda de moeda feita pela agência, uma vez que a autorização recebida do Banco Central é para operações de compra e venda de moeda com câmbio manual, de liquidação pronta. Assim, não poderia responder pela prática do câmbio paralelo.

A atuação do correspondente cambial é regida pela Resolução 3.954/2011 do Banco Central. O artigo 2º informa que o correspondente atua por conta e sob as diretrizes da instituição contratante, que assume inteira responsabilidade pelo atendimento prestado aos clientes e usuários.

A norma ainda diz que é da corretora de câmbio a responsabilidade de garantir a integridade, a confiabilidade, a segurança e o sigilo das transações realizadas por meio do contratado, bem como o cumprimento da legislação e da regulamentação relativa a essas transações.

"Diante dessa norma, a Corretora de Câmbio assume a inteira responsabilidade pelo atendimento prestado aos clientes e usuários por seu correspondente contratado. Diante disso, verifica-se a existência de responsabilidade solidária entre as rés", concluiu a juíza.

Advogado da vítima, Hugo Mesquita Póvoa, da Mesquita Póvoa Advocacia, explicou que a responsabilidade solidária decorre do Código de Defesa do Consumidor e, especialmente, da Resolução n° 3.954/2011 do Banco Central do Brasil, "não podendo tal ônus recair sobre o consumidor".

A condenação foi pela devolução do dinheiro pago à agência de turismo, acrescido de juros legais de 1% ao mês desde a citação, e do pagamento de R$ 3 mil título de danos morais, a ser corrigida monetariamente, pelo INPC, desde a data desta decisão.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0719140-61.2020.8.07.0016

Fonte: Conjur - Consultor Jurídico - 08/02/2021

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Pacote Anticrime: a interpretação do STJ no primeiro ano de vigência da nova lei

 

Dir. Processual Penal

 - Atualizado em 


​​​​Em meio à pandemia da Covid-19, o número de assassinatos voltou a crescer no Brasil, depois de dois anos seguidos de queda. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o primeiro semestre de 2020 teve alta de 7,1% no volume de mortes violentas intencionais, em comparação com o mesmo período do ano anterior. Nos seis primeiros meses de 2020, foram registradas 25.712 ocorrências de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e óbitos decorrentes de intervenção policial, o que equivale a uma pessoa morta a cada dez minutos.

De acordo com o 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública do FBSP, houve crescimento também no quantitativo de casos de violência contra a mulher, com uma agressão física de dois em dois minutos e um estupro a cada oito minutos. Conforme o levantamento, o número de denúncias de violência de gênero levadas às polícias militares aumentou em 3,8% no comparativo entre o primeiro semestre de 2019 e os seis primeiros meses do ano passado, com um total de 147.379 chamados em todo o país.

As estatísticas da violência urbana no Brasil são traduzidas em uma sensação generalizada de insegurança, que resulta em uma cobrança da sociedade por medidas de endurecimento do combate à criminalidade. Pesquisas do Instituto Datafolha realizadas em 2018 e 2019 revelam, por exemplo, o apoio majoritário da população brasileira à aprovação da pena de morte e da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.

Endurecimento le​​gal

Foi no embalo do clamor popular por maior repressão aos criminosos que o Congresso aprovou a Lei 13.964/2019, conhecida como Pacote ou Lei Anticrime. Em vigor desde janeiro do ano passado, o pacote alterou dispositivos de 17 leis penais, a exemplo do Código Penal (CP), do Código de Processo Penal (CPP) e da Lei de Execução Penal (LEP).

Entre as novidades, a Lei Anticrime elevou de 30 para 40 anos o tempo máximo da pena de reclusão, ampliou o rol de crimes considerados hediondos – foram incluídos delitos como genocídio, roubo com restrição de liberdade da vítima e furto com uso de explosivo – e limitou as hipóteses de progressão de regime e de livramento condicional.

Somente duas regras ainda não entraram em vigor. Uma delas é a criação do juiz das garantias, com o acréscimo dos artigos 3ª-A a 3º-F no CPP. A outra é a exigência de realização de audiências de custódia no prazo máximo de 24 horas após a prisão em flagrante, conforme nova redação dada ao artigo 310 do CPP. Ambas as normas estão suspensas por liminar do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, relator das ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305.

Durante o primeiro ano de vigência da Lei 13.964/2019, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem uniformizando a interpretação de seus dispositivos. Acórdãos sobre o Pacote Anticrime foram divulgados em seis edições do Informativo de Jurisprudência, publicação periódica produzida pela Secretaria de Jurisprudência do tribunal.

Contemporaneida​​de

As novas regras da prisão preventiva são o tema mais frequente na jurisprudência do STJ em torno da Lei Anticrime. Em uma série de julgados, as turmas penais vêm consolidando o entendimento de que a Lei 13.964/2019 – nos termos da redação conferida ao artigo 315 do CPP – exige expressamente que a imposição de preventiva ou de qualquer outra cautelar deve estar fundamentada em motivação concreta relacionada a fatos novos ou contemporâneos e na demonstração da imprescindibilidade da medida restritiva.

O princípio da contemporaneidade foi aplicado pela Sexta Turma para conceder, por unanimidade, habeas corpus (HC 553.310) relatado pela ministra Laurita Vaz a uma então vereadora de Bertioga (SP), denunciada pela suposta prática do crime de concussão no seu gabinete parlamentar.

Segundo o Ministério Público de São Paulo, entre 2013 e 2014, ela teria exigido de dois assessores parte de sua remuneração mensal, totalizando cerca de R$ 42 mil. Em razão da denúncia, a ex-vereadora foi afastada do cargo pelo juízo de primeiro grau.

Ao apreciar o caso, a Sexta Turma revogou a suspensão do exercício da função pública. De acordo com a ministra Laurita Vaz, não houve fatos recentes que justificassem a implementação da cautelar. Como destacou a ministra, o afastamento do cargo foi determinado mais de cinco anos depois dos episódios narrados na denúncia.

“Em que pese, de fato, a gravidade e a reprovabilidade das condutas imputadas à paciente, verifica-se que não foi demonstrada, na espécie, a indispensabilidade atual da restrição, nos termos do parágrafo 1º do artigo 315 do Código de Processo Penal, incluído pela Lei 13.964/2019”, concluiu.

Ex off​​icio

Ao contrário do reconhecimento do princípio da contemporaneidade, um tema não consensual na corte superior é a conversão, de ofício, da prisão em flagrante em preventiva, à luz da redação dada ao artigo 311 do CPP pelo Pacote Anticrime. Ao longo de 2020, a Quinta Turma alterou o próprio entendimento a respeito da matéria.

O colegiado compreendia que a nova legislação mantém no ordenamento jurídico a autorização para o juiz converter o flagrante em segregação provisória sem prévio requerimento. Como registrado pela edição 679 do Informativo de Jurisprudência, a turma penal referendou, por unanimidade, a decisão que indeferiu habeas corpus (AgRg no HC 611.940) impetrado por um suspeito de praticar, em Santa Catarina, os delitos de organização criminosa, receptação e adulteração de sinal identificador de veículo.

Ao votar pela manutenção da custódia cautelar do acusado, o relator do HC, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou que a Lei Anticrime excluiu apenas a possibilidade da imposição, de ofício, de prisão preventiva.

“Embora a Lei 13.964/2019 tenha retirado a possibilidade de decretação da prisão preventiva, de ofício, do artigo 311 do Código de Processo Penal, no caso, trata-se da conversão da prisão em flagrante, hipótese distinta e amparada pela regra específica do artigo 310, II, do CPP”, explicou.

Posteriormente, a Quinta Turma fixou tese em sentido contrário. No HC 590.039, impetrado pela Defensoria Pública de Goiás, o colegiado, por unanimidade, concedeu a ordem para anular duas prisões cautelares impostas sem prévia manifestação das partes, do Ministério Público ou da autoridade policial, em razão de flagrante da prática do crime de receptação.

Segundo o relator do processo, ministro Ribeiro Dantas, o Pacote Anticrime modificou a redação do parágrafo 2º do artigo 282 do CPP, de modo a definir que qualquer medida cautelar somente será decretada pelo magistrado mediante provocação.

“Parece evidente a intenção legislativa de buscar a efetivação do sistema penal acusatório, vontade explicitada, inclusive, quando da inclusão do artigo 3º-A no Código de Processo Penal, que dispõe que o processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação”, complementou.

A fim de pacificar a interpretação do tema, a Quinta Turma afetou para a Terceira Seção o julgamento do recurso em habeas corpus (RHC 131.263) no qual um acusado pelo crime de tráfico de drogas foi detido preventivamente, de ofício, após o flagrante em Goiás. O ministro Sebastião Reis Júnior é o relator do caso, que teve a análise interrompida por um pedido de vista do ministro Joel Ilan Paciornik.

Revisão periódi​​​ca

Ainda em matéria de prisão preventiva, o STJ firmou entendimento sobre a norma inscrita no parágrafo único do artigo 316 do CPP, nos termos da Lei Anticrime. O dispositivo inovou ao estabelecer a necessidade de revisão da segregação cautelar a cada 90 dias. De acordo com a edição 680 do Informativo de Jurisprudência, uma das teses delimitadas é a de que a obrigação de rever a preventiva de três em três meses vale apenas para o juiz ou o tribunal que impuser a custódia provisória.

No caso concreto, a Sexta Turma, por unanimidade, negou habeas corpus (HC 589.544) em que um homem condenado em primeira e segunda instâncias pelo cometimento do crime de extorsão questionava o fato de o Tribunal de Justiça de Santa Catarina não ter revisado a prisão preventiva decretada pelo juízo de primeiro grau.

A relatora do habeas corpus, ministra Laurita Vaz, enfatizou que o Pacote Anticrime é literal ao atribuir exclusivamente ao órgão emissor da decisão o dever de reavaliar a prisão cautelar. “A inovação legislativa se apresenta como uma forma de evitar o prolongamento da medida cautelar extrema, por prazo indeterminado, sem formação da culpa”, comentou.

Também no tocante à regra da revisão da preventiva a cada 90 dias – inserida no artigo 316 do CPP –, o STJ vem compreendendo que a inovação processual da Lei 13.964/2019 não resulta em soltura automática em caso de eventual atraso na reavaliação da conveniência da segregação provisória.

Esse posicionamento das turmas de direito penal foi reforçado por precedente do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Suspensão de Liminar 1.395. Em outubro passado, por maioria, a corte manteve a suspensão da eficácia de liminar que havia colocado em liberdade André Oliveira Macedo, apontado como um dos líderes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). André do Rap, como é conhecido, está foragido.

Antes do julgado do STF, a Quinta Turma do STJ, por unanimidade, adotou a mesma interpretação ao manter a custódia cautelar contra um homem condenado na Justiça Federal da 1ª Região por tráfico internacional de entorpecentes e organização criminosa, depois de ter sido apreendido na posse de 257 quilos de cocaína. Ele permanecia preso provisoriamente desde dezembro de 2017, sem que a medida fosse revista, como prevê o Pacote Anticrime.

Relator do HC 605.590, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca afirmou – ao julgar agravo contra sua decisão monocrática que negou o relaxamento da prisão ao paciente – que o descumprimento do prazo nonagesimal para a rediscussão da preventiva “não implica automático reconhecimento da ilegalidade da prisão, tampouco a imediata colocação do custodiado cautelar em liberdade”.

Progressão prisio​​​nal

Em relação aos condenados, a Lei Anticrime promoveu nova disciplina no artigo 112 da Lei de Execução Penal, por meio de uma escala com percentuais de observância da pena para a progressão de regime, a depender da natureza da sanção e do perfil do apenado. Contudo, conforme a jurisprudência das turmas penais, resta uma lacuna legal no caso de quem cumpre pena por crime hediondo e possui condenação anterior pela prática de delito comum.

A matéria foi examinada pela Sexta Turma, por exemplo, em habeas corpus (HC 607.190) no qual a Defensoria Pública de São Paulo pleiteava que um condenado em regime fechado por tráfico de drogas e furto qualificado, reincidente simples, tivesse direito à progressão com base em prazo mais vantajoso previsto na Lei 13.964/2019.

Na origem, o Tribunal de Justiça paulista manteve o patamar inicial de 60% da pena, destinado aos que cometem crime hediondo e são reincidentes em igual modalidade delitiva, nos termos do Pacote Anticrime. A Sexta Turma, por unanimidade, deferiu o pedido de habeas corpus, determinando que a progressão ocorra quando for atingido o percentual de 40% da sanção, reservado aos apenados primários na prática de crime hediondo.

Segundo o relator do processo, ministro Nefi Cordeiro, diante da ausência de previsão legal, o magistrado deve buscar a solução mais favorável ao réu por meio da analogia in bonam partem. “Desse modo, forçoso reconhecer que, diante de duas situações, em obediência ao princípio do favor rei, ao paciente se deve aplicar a norma penal mais benéfica”, resumiu.

Livramento con​dicional

Outra novidade da Lei Anticrime no campo da execução penal é a ampliação dos requisitos para o livramento condicional, conforme a redação dada ao artigo 83 do Código Penal. Nas turmas de direito penal, houve reorientação jurisprudencial a partir da nova exigência legal de não cometimento de falta disciplinar grave nos 12 meses anteriores para a concessão do benefício (a Súmula 441 do STJ reconhece que a falta grave não interrompe o prazo para a obtenção de livramento condicional).

Os julgados do tribunal vêm asseverando ainda que, além do período de um ano sem falta grave, a Lei 13.964/2019 demanda a existência de circunstâncias pessoais favoráveis para se autorizar o benefício. Exemplo de tal posição foi o julgamento em que, por unanimidade, a Quinta Turma não conheceu de habeas corpus (HC 616.951) no qual a Defensoria Pública de São Paulo contestava a exigência de exame criminológico para a concessão de livramento condicional a um homem apenado por cinco roubos qualificados e que cometeu nove faltas graves durante o cumprimento da pena.

A última falta grave havia sido cometida há mais de dois anos. Mas, de acordo com o relator, ministro Felix Fischer, além das faltas, o réu apresentou indicativos desfavoráveis no exame criminológico anterior, o que levou à determinação da nova prova técnica.

Fischer citou trecho do Pacote Anticrime segundo o qual as condições subjetivas necessárias a quem requer o benefício são “comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto”. A Quinta Turma recomendou celeridade na realização do exame.

​Tráfico privile​​​giado

A Lei Anticrime também tratou do regime de cumprimento da pena para condenados por tráfico privilegiado, modalidade elencada no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). Esse dispositivo permite a redução da pena em até dois terços – chegando ao mínimo legal de um ano e oito meses – quando a quantidade de material apreendido não é elevada, o agente é primário, de bons antecedentes e não se dedica a delitos nem integra organização criminosa.

Normatizando jurisprudência consolidada no STF e no STJ, a Lei 13.964/2019 alterou a redação do parágrafo 5º do artigo 112 da LEP para retirar o caráter hediondo do tráfico privilegiado. Como registra a edição 683 do Informativo de Jurisprudência, a novidade fundamentou a decisão unânime da Sexta Turma de conceder habeas corpus coletivo (HC 596.603), pedido pela Defensoria Pública de São Paulo, para fixar o regime aberto a todas as pessoas condenadas no estado por tráfico privilegiado, com pena de um ano e oito meses.

Segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo listados no processo, 1.018 homens e 82 mulheres cumpriam, em março passado, a pena mínima por tráfico em regime fechado. De maneira preventiva, eventuais novos apenados nas mesmas condições deverão ser igualmente contemplados pela decisão do STJ, impedindo-se a decretação de regime fechado pela Justiça paulista.

No voto, o relator do habeas corpus, ministro Rogerio Schietti Cruz, criticou a insistente desconsideração das diretrizes derivadas das cortes superiores relativas ao tema, por parte das demais instâncias: “Produz um desgaste permanente da função jurisdicional, com anulação e/ou repetição de atos, e implica inevitável lesão financeira ao erário, bem como gera insegurança jurídica e clara ausência de isonomia na aplicação da lei aos jurisdicionados”.

Esteli​​onato

Outra mudança promovida pelo Pacote Anticrime é a obrigatoriedade da representação da vítima no crime de estelionato, salvo se praticado contra a administração pública, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência mental, maiores de 70 anos ou incapazes. Há divergência entre as turmas penais quanto ao alcance da retroatividade da nova regra, ponto em torno do qual permanece omissão legal.

Para a Quinta Turma – edição 674 do Informativo de Jurisprudência –, o parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal, inserido pela Lei 13.964/2019, não pode ser aplicado aos processos em que o Ministério Público já ofereceu denúncia. Esse foi o posicionamento unânime do colegiado no julgamento de habeas corpus (HC 573.093) em que a Defensoria Pública de Santa Catarina  pleiteava a anulação do processo de um homem condenado por estelionato, sem que a vítima houvesse se pronunciado a respeito da persecução penal.

De acordo com o relator do caso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, as denúncias de estelionato já ofertadas estão protegidas pelo princípio do ato jurídico perfeito. “As condições de procedibilidade, que alguns autores chamam de condições de admissibilidade do processo penal ou, ainda, de pressupostos processuais, não se confundem com as condições de prosseguibilidade”, afirmou o ministro ao explicar que a representação é requisito para o início, e não para a continuidade de uma ação penal.

Já no HC 583.837 – edição 677 do Informativo de Jurisprudência –, a Sexta Turma decidiu, por unanimidade, pela retroatividade da exigência de representação da vítima em todos os processos por estelionato ainda não transitados em julgado, mas sem a extinção automática da punibilidade naqueles em que o ofendido não tenha se manifestado favoravelmente à persecução penal.

A decisão do colegiado se deu no julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que manteve o réu condenado à pena de reclusão por estelionato, apesar da ausência de representação da vítima. No voto, o ministro relator, Sebastião Reis Júnior, disse que as normas regulamentadoras da ação penal são regidas pelos princípios da retroatividade e da ultratividade benéficas, pois disciplinam o exercício da pretensão punitiva.

“Parece notório que o parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal, inserido pela Lei 13.694/2019, é norma mais benéfica em relação ao regime anterior. E, pelo caráter misto, alcança casos anteriores à sua vigência”, declarou.

Não persecução​​ penal

O STJ também busca uniformizar a interpretação em relação à retroatividade do instituto do acordo de não persecução penal. Ao criar o artigo 28-A do CPP, a Lei 13.964/2019 abriu a possibilidade de que o Ministério Público proponha ao acusado acordo para a não abertura de ação penal, desde que preenchidos os requisitos legais de confissão de crime sem violência ou grave ameaça, de pena mínima inferior a quatro anos, e mediante o cumprimento de obrigações como a prestação de serviços comunitários.

A Sexta Turma afetou a matéria para julgamento na Terceira Seção. O habeas corpus (HC 596.340) em análise foi impetrado pela defesa de um homem denunciado pelo crime de furto qualificado, que confessou o delito, mas teve negado o pedido para negociar um acordo de não persecução penal após parecer contrário do Ministério Público do Tocantins. Em liminar, o relator do processo, ministro Rogerio Schietti Cruz, suspendeu a ação penal até o exame de mérito do caso.

A Quinta Turma, por sua vez, vem firmando a tese de que a retroatividade do acordo de não persecução penal só é válida se a denúncia não tiver sido recebida. Esse entendimento embasou a decisão do colegiado que, por unanimidade, manteve o desprovimento de recurso especial (AgRg no REsp 1.886.717) interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região contrário à retroatividade do acordo.

O caso concreto envolvia um condenado por contrabando de medicamentos importados. Segundo o relator do recurso, ministro Felix Fischer, o artigo 2º do Código de Processo Penal dispõe que as normas processuais penais não possuem efeito retroativo.

“Da simples leitura do artigo 28-A do CPP se verifica a ausência dos requisitos para a sua aplicação, porquanto o recorrente, em momento algum, confessou formal e circunstancialmente a prática de infração penal, pressuposto básico para a possibilidade de oferecimento de acordo de não persecução penal”, complementou.

STJ
#pacote #anticrime

Mulher terá que indenizar vizinho do andar de baixo por perturbação

 

Dano Moral

 - Atualizado em 


Por causar barulho em apartamento da Asa Norte após as 22h, uma mulher deverá indenizar o vizinho do andar de baixo em R$ 2 mil pelos danos morais provocados, com base na Lei do Silêncio. A decisão é da juíza titular do 6º Juizado Especial Cível de Brasília, Marília de Ávila e Silva Sampaio, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).

O autor da ação mora em um prédio na região há quase 30 anos. Ele narrou que convivia em harmonia com a vizinhança até 2019, quando houve a mudança da ré para o apartamento de cima. Segundo ele, ela passou a implicar com supostos barulhos vindos de seu apartamento e sempre provocou perturbação nos locais nos quais morou, além de responder por agressão no trânsito contra pessoa idosa, dentre outros processos judiciais.

Ele acrescenta que a mulher foi notificada, em março de 2020, pelo condomínio em razão da perturbação do sossego, sendo registrado boletim de ocorrência, mas seu comportamento abusivo persistiu durante a pandemia da covid-19 no DF.

A ré diz que realizou as perturbações alegadas pelo autor, e defende que o barulho após o horário permitido é produzido na residência dele. A mulher ainda diz que não há prova de que ela seja a autora dos fatos e defende que não há dano a ser indenizado.

Quando a juíza analisou o caso, constatou que o autor colecionou documentos para comprovar as alegações, tais como boletim de ocorrência, cartas, notificação da ré acerca da perturbação do sossego, além de vídeos e áudios que mostram barulho de salto e pulos. A ré, por sua vez, diz que a perturbação era causada pelo autor e sua família. O argumento de defesa foi a transcrição de conversa em grupo de WhattsApp, onde registra ocorrência de barulho produzido em horário de preservação do silêncio. Contudo, não consta que o barulho fora produzido pelo autor.

Diante disso, a magistrada conclui que “o que se nota pelas multas impostas à requerida, diante de reiterado comportamento antissocial no condomínio (…) é que as alegações do autor quanto à perturbação do sossego são procedentes”. A juíza também considerou o testemunho de outros moradores do prédio e da síndica do condomínio, que relata que “além do autor, havia outra pessoa reclamando do barulho; que teve outro episódio com os moradores do apartamento 303.”

Com isso, a juíza definiu que a responsabilidade civil é da ré, diante da conduta ilícita reiteradamente praticada. Quanto ao pedido de reparação por danos morais, a magistrada considerou que no caso está clara a ofensa a direito da personalidade do autor, uma vez que “a requerida, mediante conduta ilícita, configurada pelo barulho produzido em seu apartamento no período destinado ao descanso, perturbou o sossego e intimidade do lar do autor”.

Correio Braziliense
Fonte: www.correiobraziliense.com.br


Foto: divulgação da Web

Turma Nacional reconhece direito de portadora de HIV de receber benefício assistencial

 

Direito Previdenciário

 - Atualizado em 


Wanessa Rodrigues

A Turma Nacional de Uniformização (TNU) dos Juizados Especiais Federais reconheceu o direito de uma mulher com HIV e outras enfermidades de receber o benefício assistencial BCP – LOAS, que é concedido a pessoas com deficiência e a idosos. O benefício havia sido negado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sob o argumento de que a mulher, moradora de Aparecida de Goiânia, na Região Metropolitana de Goiânia, não atende critério de deficiência para acesso ao BPC-LOAS.

A decisão é do ministro Ricardo Villas Boas Cueva, presidente da TNU, que admitiu o incidente de uniformização e determinou a restituição do feito à origem para adequação do julgado. Em primeiro grau, o juiz federal substituto Gabriel M. T. Valente dos Reis, do Juizado Especial Federal Cível e Criminal de Aparecida de Goiânia, entendeu que, apesar de a mulher ser portadora de HIV e transtorno afetivo bipolar, seu quadro não configura deficiência. A sentença foi mantida pela 2ª Relatoria da 2ª Turma Recursal da SJGO.

Os advogados Wesley Junqueira Castro, Joselito Francisco Xavier e Rômulo Rodrigues Rêgo, do escritório Xavier & Junqueira Advogados Associados, ingressaram com Pedido de Uniformização de interpretação de lei federal na TNU sob o argumento de que esta não é a melhor interpretação a ser dada ao artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social. Isso porque, ao limitar-se a incapacidade física, como fundamentado na sentença e acórdão, não levam em conta as peculiaridades de ser a recorrente portadora do vírus HIV.

Argumentaram ainda que a Súmula 78 da TNU dispõe que, comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença. Citaram entendimentos de outras turmas recursais em casos semelhantes.

Decisão
Em sua decisão, o presidente da TNU ressaltou que é inegável que os portadores do HIV sofrem de enfermidade estigmatizante. E, ao citar a Súmula 78, salientou que o acórdão recorrido não se atentou para os critérios considerados importantes na aferição, ou não, de “incapacidade de longo prazo”. Completou que o exame de todo o processado revela que as conclusões da origem não estão conforme o posicionamento visto.

O caso
Conforme consta nos autos, a mulher é portadora de HIV, sífilis e problemas psiquiátricos, entre eles transtorno afetivo bipolar. Salienta que este último começou aos 18 anos e que, desde então, ela não conseguiu laborar com CLT assinada. Relatórios médicos apontam, ainda, que ela apresenta quadro de inviolabilidade, tristeza, desânimo, alucinações auditivas, delírios e ideação suicida, situações que prejudicam sua vida em sociedade e a impedem de desenvolver atividades laborais.

Diante de todo esse quadro, faz uso de medicamentos pesados, porém não tem condições financeiras de arcar com os remédios e de sustentar sua família. Diz que ela mora em um quarto com a filha e vive de doações. No entanto, malgrado a comprovação de sua incapacidade e seu estado de miséria, pedido administrativo, formulado em dezembro de 2018, foi indeferido.

ROTAJURÍDICA


Foto: divulgação da Web

Justiça condena empresa por não entregar cadeira de rodas a comprador


Publicado em 08/02/2021

TJ/MG considerou que não foi aborrecimento comum ao cotidiano, pois impacta no uso diário e permanente do portador de paralisia cerebral.

O irmão e curador de um portador de paralisia cerebral vai receber R$ 3 mil de uma fabricante de cadeira de rodas por danos morais. O cliente de Bom Despacho, no centro-oeste mineiro, encomendou o equipamento, mas o produto não foi entregue. Decisão é da 14ª câmara Cível do TJ/MG. 

O comprador afirma que adquiriu a cadeira de rodas pelo preço de R$ 3.300, com entrada de R$ 1.500 e pagamento do restante na entrega. Como o produto nunca chegou, ele ajuizou ação pedindo a rescisão do contrato, a restituição da quantia já paga em dobro e indenização por danos morais.

O juízo de 1º grau acatou apenas o pedido de ressarcimento dos danos materiais de R$ 1.500.

O consumidor recorreu contra a sentença, alegando que esperou muito tempo pelo produto e tentou solucionar o problema por telefone sem sucesso. Ele argumentou que o bem é essencial para proporcionar um mínimo de conforto ao irmão.

Ao analisar o recurso, o relator, desembargador Estevão Lucchesi, entendeu que houve lesão a um direito de personalidade, pois deixou de ser entregue um produto essencial para proporcionar maior conforto e mobilidade a uma pessoa com deficiência.

"A hipótese vertente não pode ser tratada como um mero dissabor ou aborrecimento comum ao cotidiano em razão da natureza do produto cuja entrega deixou de ser realizada (cadeira de rodas), pois impacta no uso diário e permanente para o interessando, sendo indispensável a seus afazeres."

Assim, condenou a empresa à indenização por danos morais em R$ 3 mil.

Processo: 5001138-85.2019.8.13.0074

Veja o acórdão.

Fonte: migalhas.com.br - 07/02/2021

Academia terá que indenizar aluno que sofreu acidente em aparelho defeituoso

 


Publicado em 08/02/2021

Acidente com aparelho defeituoso que provoque lesão, somada a falta de assistência dos funcionários da academia de ginástica, caracteriza dano moral. O entendimento é da 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal.  

Aluno da Corpo Mais Personal Academia, o autor relata que teve o dedo da mão “quase decepado” ao tentar guardar um halter que estava danificado, o que impossibilitava que fosse armazenado de forma adequada no suporte. Relata que o aparelho escorregou e prensou o dedo na barra de suporte. Conta que precisou buscar atendimento médico e que a ré não prestou a assistência necessária.   

Decisão do 1º Juizado Especial Cível de Águas Claras condenou a academia a pagar a quantia de R$ 1 mil a título de danos morais e declarou rescindido o contrato sem ônus. O autor recorreu alegando que sofreu violação da sua integridade física e pedindo a majoração do valor fixando.  

Ao analisar o recurso, os magistrados lembraram que a indenização por danos morais serve como meio de compensação pelos constrangimentos, aborrecimentos e humilhações experimentados pelo autor, punição para os réus e prevenção futura quanto a fatos semelhantes. No caso, segundo os julgadores, as fotografias mostram a gravidade do dano à integridade física do autor, que teve o dedo saturado por conta do acidente. 

“A má condição do halter, estando a academia ciente da situação, que inclusive já teria acarretado problemas com outro aluno, expôs a parte autora a risco significativo de que o seu dedo fosse decepado conforme a dinâmica do acidente, além de ausente a devida prestação de auxílio no momento do incidente. Portanto, face o dano à sua integridade física, acrescido da angústia da situação e do descaso da parte ré no momento do acidente e pela manutenção de aparelho em condições inadequadas, e atento às diretrizes acima elencadas, entende-se que o valor da condenação deve ser majorado”, pontuaram.  

Dessa forma, por unanimidade, a Turma conheceu o recurso para majorar o valor a título de danos morais para R$ 3 mil.  

PJe2: 0702038-14.2020.8.07.0020

Fonte: TJDF - Tribunal de Justiça do Distrito Federal - 05/02/2021

Condenação penal por erro médico

 


Publicado em 08/02/2021

Imperícia médica

A 2ª Câmara Criminal do TJRS reverteu sentença de primeiro grau e - acolhendo recurso dos assistentes de acusação - condenou criminalmente a médica porto-alegrense Vera Lúcia Feldens por homicídio culposo, na modalidade de imperícia. O evento causou a morte de um bebê, no Hospital Moinhos de Vento, em julho de 2016.

Como o MP pedira em primeiro grau a improcedência da ação penal, deixando de interpor apelação criminal em face da absolvição, os pais do bebê falecido - na condição de assistentes da acusação - exerceram o seu direito.

Nessa linha, foi aplicado precedente do STJ de que “o assistente de acusação possui legitimidade para interpor recurso de apelação, em caráter supletivo, nos termos do artigo 598 do Código de Processo Penal, mesmo que o Ministério Público tenha requerido a absolvição”.

A condenação que alcança a obstetra Vera Lúcia Feldens é de um ano e quatro meses de detenção em regime aberto; a pena foi substituída por sanções restritivas de direito: pagamento de prestação pecuniária de 50 salários mínimos e de indenização por dano moral, em favor dos pais da criança, no valor de 100 salários mínimos. Não há trânsito em julgado. A ação tramita sem segredo de justiça. (Proc. nº 70080633829).

Para entender o erro médico 

São assistentes da acusação, na ação, os pais do menino morto: o advogado Eduardo de Azambuja Paim e a juíza de Direito Sonia Fátima Battistela. O MP-RS havia sustentado, para pedir a absolvição obtida em primeiro grau, que a morte decorrera de "concausa preexistente e absolutamente independente do agir da ré", no caso, uma ´bossa sanguínea´ na cabeça da criança.

O Espaço Vital pediu aos advogados José Antonio Paganella Boschi, Marcus Vinicius Boschi e Raquel Souza da Luz Boschi uma síntese sobre a controvérsia judicial: “Demonstramos na apelação que haviam sido as fraturas nos parietais esquerdo e direito da criança - registradas no laudo pericial oficial - a verdadeira causa da morte do bebê. Provamos que, ante a dificuldade do parto natural, a médica ré, ao invés de partir para o procedimento cesáreo, continuou, por longo período de tempo com manobras que culminaram com o uso de fórceps com o qual ela não estava habituada a trabalhar. As fraturas foram causadas pelo imperito uso desse instrumento nas tentativas de extração da criança”.

Os dois advogados de defesa da acusada não responderam à solicitação enviada pelo Espaço Vital. A prestação jurisdicional no TJRS ainda compreenderá o julgamento de embargos de declaração interpostos pela médica ré.

Fonte: Espaço Vital - www.espacovital.com.br - 05/02/2021