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segunda-feira, 28 de junho de 2021

Casamento ou união estável: O direito real de habitação na visão do STJ

 

Direito Civil

 - Atualizado em 


Para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o direito real de habitação tem como finalidade principal garantir o direito constitucional à moradia ao cônjuge sobrevivente, tanto no casamento como na união estável (EREsp 1.520.294 e Aglnt no Resp 1.757.984).

Segundo a jurisprudência do tribunal, o direito real de habitação – vitalício e personalíssimo – emana diretamente da lei (artigo 1.831 do Código Civil de 2002 e artigo 7º da Lei 9.272/1996) e objetiva assegurar moradia digna ao viúvo ou à viúva no local em que antes residia com sua família.

É instituto intrinsecamente ligado à sucessão, razão pela qual os direitos de propriedade originados da transmissão da herança sofrem um abrandamento temporário em prol da manutenção da posse exercida por um dos integrantes do casal (EREsp 1.520.294).

Para o STJ, o direito real de habitação deve ser conferido ao cônjuge/companheiro sobrevivente não apenas quando houver descendentes comuns, mas também quando concorrem filhos exclusivos do cônjuge falecido (REsp 1.134.387).

Além disso, devido à sua natureza, a corte tem decidido que, para o instituto produzir efeitos, é desnecessária a inscrição do bem no cartório de registro de imóveis (REsp 1.846.167).

Como se vê, o direito real de habitação pode sofrer interpretações em relação à sua aplicabilidade e, como qualquer outro direito, também é passível de sofrer limitações.

A seguir, alguns casos em que o STJ analisou e firmou tese sobre o assunto.

Direito de habitação para o companh​​eiro sobrevivente

Com o advento do Código Civil de 2002 (CC/2002), surgiu nos tribunais brasileiros a discussão acerca da subsistência do direito real de habitação para o companheiro sobrevivente.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, tal debate ocorreu porque a sucessão do companheiro foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Lei 8.971/1994. Posteriormente, foi editada a Lei 9.278/1996, a qual consagrou o direito real de habitação ao convivente supérstite “enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento” (REsp 1.846.167).

Nancy Andrighi lembrou que o CC/2002, por sua vez, apenas previu tal direito ao cônjuge sobrevivente, nada dispondo sobre sua aplicação ao companheiro, o que instaurou “acirrado debate”, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, sobre a revogação ou não da Lei 9.278/1996 pelo CC/2002.

“Essa questão chegou a este tribunal superior, que firmou orientação pela preservação do referido diploma legislativo e, consequentemente, pela manutenção do direito real de habitação ao companheiro supérstite”, completou a magistrada.

No julgamento do AgRg no REsp 1.436.350, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino também destacou não terem sido revogadas as disposições da Lei 9.278/1996, “subsistindo a norma que confere o direito real de habitação ao companheiro sobrevivente diante da omissão do Código Civil em disciplinar tal matéria em relação aos conviventes em união estável, consoante o princípio da especialidade”.

O ministro Luis Felipe Salomão ressaltou que o direito real de habitação é ex vi legis (por força da lei), decorrente do direito sucessório (artigo 1.831 do CC/2002); portanto, pode ser exercido desde a abertura da sucessão (REsp 1.315.606).

Para o magistrado, a partir desse momento, o cônjuge ou companheiro sobrevivente tem instrumentos processuais para garantir o exercício do direito de habitação, inclusive por meio de ação possessória.

Posse de outros bens no patrimônio p​​essoal

O direito real de habitação do cônjuge sobrevivente, nos termos do artigo 1.831 do CC/2002, é garantido independentemente de ele possuir outros bens em seu patrimônio pessoal.

Com esse fundamento, a Terceira Turma negou provimento ao REsp 1.582.178, que questionava a permanência de uma viúva no imóvel familiar com a alegação de que ela possuía outros imóveis.

Para o ministro Villas Bôas Cueva, relator, a única condição que o legislador impôs para assegurar o direito real de habitação é que o imóvel destinado à residência do casal seja o único daquela natureza a inventariar.

“Nenhum dos mencionados dispositivos legais impõe como requisito para o reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge sobrevivente”, fundamentou.

O relator citou precedente da Quarta Turma, de 2013 (REsp 1.249.227), no sentido de que o direito real de habitação é conferido em lei independentemente de o cônjuge ou companheiro sobrevivente ser proprietário de outros imóveis.

Villas Bôas Cueva destacou que a parte final do artigo 1.831 faz referência à necessidade de que o imóvel seja “o único daquela natureza a inventariar”, mas mesmo essa exigência não é interpretada de forma literal pela jurisprudência.

“Nota-se que até mesmo essa exigência legal – inexistência de outros bens imóveis residenciais no acervo hereditário – é amplamente controvertida em sede doutrinária. Daí porque esta corte, em pelo menos uma oportunidade, já afastou a literalidade de tal regra”, disse ele.

Herdeiros não podem cobrar alu​​guel

O direito real de habitação tem caráter gratuito (artigo 1.414 do Código Civil), razão pela qual os herdeiros não podem exigir remuneração do companheiro sobrevivente pelo uso do imóvel, nem a extinção do condomínio e a alienação do bem enquanto perdurar esse direito.

Tal entendimento foi reafirmado pela Terceira Turma no julgamento do REsp 1.846.167. A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que o direito real de habitação reconhecido ao cônjuge ou companheiro sobrevivente decorre de imposição legal, tem natureza vitalícia e personalíssima, o que significa que ele pode permanecer no imóvel até a morte.

Dessa forma, na sucessão por falecimento, a extinção do condomínio em relação a imóvel sobre o qual recai o direito real de habitação contraria a própria essência dessa garantia, que visa proteger o núcleo familiar.

Também por causa dessa proteção constitucional e pelo caráter gratuito do direito real de habitação, não é possível exigir do ocupante do imóvel qualquer contrapartida financeira em favor dos herdeiros que não usufruem do bem. “Sua finalidade é assegurar que o viúvo ou viúva permaneça no local em que antes residia com sua família, garantindo-lhe uma moradia digna”, afirmou a ministra.

De acordo com a relatora, a intromissão do Estado na livre capacidade das pessoas de disporem de seu patrimônio só se justifica pela proteção constitucional garantida à família. Dessa forma, apontou, é possível, em exercício de ponderação de valores, a mitigação de um deles – relacionado aos direitos de propriedade – para assegurar o outro, a proteção do grupo familiar.

Copropriedade com terceiro anterior à suc​essão

A copropriedade anterior à abertura da suce​ssão impede o reconhecimento do direito real de habitação, pois há titularidade comum a terceiros estranhos à relação sucessória que ampararia o pretendido direito (EREsp 1.520.294).

Nesse sentido, a Segunda Seção negou o pedido de uma viúva que pretendia ver reconhecido o direito real de habitação sobre o imóvel em que morava, comprado pelo seu falecido marido em copropriedade com um filho dele, antes do casamento.

A relatora, ministra Isabel Gallotti, afirmou que, como o direito real de habitação já é uma exceção criada pelo legislador, não pode haver interpretação extensiva para incluir no mesmo tratamento situações não previstas em lei – por exemplo, a hipótese em que o imóvel seja objeto de copropriedade anterior com terceiros.

A mesma tese foi reafirmada recentemente no julgamento do AgInt no REsp 1.865.202. Para o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, não há direito real de habitação do cônjuge ou companheiro sobrevivente quando o imóvel em que o casal residia não era de propriedade exclusiva do falecido, uma vez que não podem os demais condôminos se sujeitar a direito surgido apenas posteriormente, em decorrência da sucessão.

Doação do imóvel antes do cas​​​amento

No julgamento do REsp 1.315.606, a Quarta Turma negou a uma viúva o direito de continuar morando no imóvel onde tinha vivido com o marido. Isso porque em 1953, antes de seu segundo casamento, o homem doou o bem aos filhos do primeiro casamento, em antecipação de herança; porém, devido à cláusula de usufruto, permaneceu no local até sua morte.

A viúva recorreu ao STJ para permanecer na propriedade, alegando que o bem integrava o patrimônio do falecido.

Para o relator, ministro Luis Felipe Salomão, algumas peculiaridades do caso – como o fato de o imóvel não ser o único bem daquela natureza a inventariar – impediram o exercício do direito de habitação pelo cônjuge sobrevivente.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao rejeitar a pretensão da segunda esposa, havia entendido que ela ficou viúva de um usufrutuário do bem, e não do real proprietário, já que a doação tinha sido concluída antes do seu casamento. Para o ministro Salomão, tal entendimento do TJSP é discutível, pois a doação, feita como antecipação de herança, era passível de revisão futura.

“Aquela simples doação de outrora, com cláusula de usufruto, não afastou, por si só, o direito real de habitação, uma vez que existem diversas situações em que o bem poderá ser devolvido ao acervo, retornando ao patrimônio do cônjuge falecido para fins de partilha e permitindo, em tese, eventual arguição de direito real de habitação ao cônjuge”, argumentou Salomão.

Embora por fundamentos jurídicos distintos, o ministro chegou à mesma conclusão da corte paulista pela improcedência do pedido da viúva.

“Na hipótese peculiar em julgamento, não havendo nulidade da partilha ou resolução da doação, não há falar em retorno do imóvel ao patrimônio do falecido”, declarou o relator.

Direito real de habitação arguido em ação possess​​ória

Ainda que a companheira sobrevivente não tenha buscado em ação própria o reconhecimento da união estável antes da morte do companheiro, é admissível que invoque o direito real de habitação em ação possessória, a fim de ficar na posse do imóvel em que residia com o falecido.

É pacífico no STJ o entendimento de que a companheira supérstite tem direito real de habitação sobre o imóvel de propriedade do falecido, onde residia o casal, mesmo na vigência do atual Código Civil.

Adotando tais fundamentos em decisão unânime, a Quarta Turma reconheceu ser possível a arguição do direito real de habitação para fins exclusivamente possessórios, independentemente de seu reconhecimento anterior em ação própria declaratória de união estável.

O relator do caso (que tramitou em segredo de Justiça), ministro Luis Felipe Salomão, explicou que a preferência do exercício da posse do imóvel após o falecimento do companheiro é do sobrevivente.

Por isso, para o magistrado, é “plenamente possível a arguição desse direito para fins exclusivamente possessórios, até porque entender de forma diversa seria negar proteção justamente à pessoa para quem o instituto foi desenvolvido e no momento em que ele é o mais efetivo”.

Salomão acrescentou que, no caso analisado, sendo a companheira titular de direito real de habitação exercitável diretamente sobre o imóvel, a posse é inerente ao seu direito, pois, se assim não fosse, o direito não estaria assegurado.

“Levando-se em conta a posse, considerada por si mesma, enquanto mero exercício fático dos poderes inerentes ao domínio, há de ser mantida a recorrida no imóvel, até porque é ela quem vem conferindo à posse a sua função social”, concluiu.​​​

STJ

A negativação do consumidor após a prescrição da dívida conduz a dano moral

 

Direito do Consumidor

 - Atualizado em 


A jurisprudência do STJ concilia e harmoniza os prazos do § 1º com o do § 5º do art. 43 do CDC, para estabelecer que a manutenção da inscrição negativa nos cadastros de proteção ao crédito respeita a exigibilidade do débito inadimplido, tendo, para tanto, um limite máximo de cinco anos que pode ser, todavia, restringido, se for menor o prazo prescricional para a cobrança do crédito.

Com efeito, a manutenção de registro negativo no SERASA E/OU SPC, ou cartório de protesto, gera o direito de dano moral para o consumidor quando a sua dívida contado da data do vencimento for superior a cinco anos essa negativação.

O acórdão ficou assim redigido:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. BANCOS DE DADOS. PROTEÇÃO AO CRÉDITO. PRINCÍPIO DA FINALIDADE. PRINCÍPIO DA VERACIDADE DA INFORMAÇÃO. ART. 43 DO CDC. PRAZOS DE MANUTENÇÃO DE INFORMAÇÃO NO CADASTRO DE INADIMPLENTES. PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA. TERMO INICIAL. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO ARQUIVISTA. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE AO ADIMPLEMENTO. ART. 84 DO CDC. SENTENÇA. ABRANGÊNCIA NACIONAL. ART. 16 DA LEI 7.347/85.

  1. Recurso especial interposto em: 07/07/2016. Concluso ao gabinete em: 22/08/2018. Julgamento: CPC/15 2. O propósito recursal é determinar qual o termo inicial do limite temporal previsto no § 1º do art. 43 do CDC, a quem cabe a responsabilidade pela verificação do prazo máximo de permanência da inscrição em cadastros de proteção ao crédito, na hipótese de anotações decorrentes de protesto de títulos e a possibilidade de configuração de danos morais indenizáveis..
  2. A essência – e, por conseguinte, a função social dos bancos de dados – é reduzir a assimetria de informação entre o credor/vendedor, garantindo informações aptas a facilitarem a avaliação do risco dos potenciais clientes, permitindo aos credores e comerciantes estabelecer preços, taxas de juros e condições de pagamento justas e diferenciadas para bons e maus pagadores.
  3. Em vista da tensão com os direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, o CDC, disciplinando a matéria, atribuiu caráter público às entidades arquivistas, para instituir um amplo, rigoroso e público controle de suas operações, no interesse da comunidade.
  4. O princípio da finalidade atua de forma preventiva, impedindo que os dados – na maioria das vezes negativos e obtidos sem o consentimento dos consumidores – sejam desvirtuados pelos usuários do sistema, para garantir o débito, punir o devedor faltoso ou coagir ao pagamento.
  5. Os dados cadastrados de consumidores devem ser objetivos, claros e verdadeiros, haja vista que informações desatualizadas ou imprecisas dificultam a efetiva proteção ao crédito e prejudicam a atividade econômica do consumidor e também do fornecedor.
  6. As entidades mantenedoras de cadastros de crédito devem responder solidariamente com a fonte e o consulente pela inexatidão das informações constantes em seus arquivos e pelos danos que podem causar danos aos consumidores (art. 16 da Lei 12.414/2011).
  7. Nas obrigações de fazer no Direito do Consumidor, o juiz deve conceder a tutela específica da obrigação ou determinar providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento (art.

84 do CDC).

  1. A jurisprudência do STJ concilia e harmoniza os prazos do § 1º com o do § 5º do art. 43 do CDC, para estabelecer que a manutenção da inscrição negativa nos cadastros de proteção ao crédito respeita a exigibilidade do débito inadimplido, tendo, para tanto, um limite máximo de cinco anos que pode ser, todavia, restringido, se for menor o prazo prescricional para a cobrança do crédito.
  2. Em razão do respeito à exigibilidade do crédito e ao princípio da veracidade da informação, o termo inicial do limite temporal de cinco anos em que a dívida pode ser inscrita no banco de dados de inadimplência é contado do primeiro dia seguinte à data de vencimento da dívida.
  3. Os arquivistas devem adotar a posição que evite o dano potencial ao direito da personalidade do consumidor, razão pela qual é legítima a imposição da obrigação de não-fazer, consistente em não incluir em sua base de dados informações coletadas dos cartórios de protestos, sem a informação do prazo de vencimento da dívida, para controle de ambos os limites temporais estabelecidos no art. 43 da Lei 8.078/90.
  4. Condenação genérica das recorridas à indenização dos danos materiais e compensação dos danos morais eventual e individualmente sofridos pelos consumidores, desde que seja comprovado que todas as anotações em seus nomes sejam imprecisas em razão de sua desatualização.
  5. Abrangência da decisão proferida em ação coletiva em todo o território nacional, respeitados os limites objetivos e subjetivos do que decidido. Tese repetitiva.
  6. Recurso especial provido.

(REsp 1630889/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 21/09/2018)

Vale destacar a manifestação da e. Relatora nos seguintes termos:

“II.3. Do termo inicial à luz dos princípios da finalidade e da veracidade

Tendo em vista os princípios da veracidade e da finalidade, entendo que a orientação que mais se coaduna ao espírito do CDC é de que o termo a quo do quinquênio do art. 43, § 1º, do CDC deve tomar por base a data do fato gerador da informação depreciadora, o dia seguinte ao vencimento da dívida.

Em primeiro lugar porque a inscrição de dano negativo de consumo do devedor nos bancos de dados de proteção ao crédito não é imprescindível para a cobrança da dívida, consistindo, portanto, em direito potestativo do credor (TARTUCE, Flavio e NEVES, Daniel Amorim Assumpção, Manual de Direito do Consumidor. 3ª ed., São Paulo: Método, pág. 441).

Desse modo, conforme muito bem afirmado pelo e. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, o limite temporal deve ser baseado em critério objetivo, porquanto sua definição “não pode ficar submetida à vontade do banco de dados ou do fornecedor, sob pena de esvaziar, por completo, o propósito legal de impedir consequências negativas, como a denegação do crédito, em decorrência de dívidas consideradas – legalmente – antigas e irrelevantes” (REsp 1316117/SC, Terceira Turma, DJe 19/08/2016).

Ademais, conforme pontuado pela doutrina, o Código Civil de 2002 reduziu os prazos prescricionais previstos no Código Civil de 1916, fixando termos específicos para a cobrança, sendo o maior aquele para a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular, que é de 5 (cinco) anos, nos termos do art. 206, § 5º, I, do CC/02.

Assim, “no máximo, haverá uma coincidência, se a hipótese for a de ‘cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular’, para o que o Código Civil agora vigente fixa um prazo prescricional também de cinco anos” (PASSARINHO JUNIOR, Aldir. Cadastros de consumidores: questões controvertidas sob a ótica do Superior Tribunal de Justiça. Informativo jurídico da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva, Brasília, DF, v. 17, n. 1, jan./jun. 2008).

Corroborando essa assertiva doutrinária, esta Corte consignou, em julgamento de recurso especial repetitivo, que “qualquer dívida resultante de documento público ou particular, tenha ou não força executiva, submete-se à prescrição quinquenal, contando-se do respectivo vencimento” (REsp 1101412/SP, Segunda Seção, DJe 03/02/2014).

Tendo essa coincidência em vista, somada à circunstância de que os limites temporais de manutenção da informação devem ter cunho objetivo, penso que o termo inicial do prazo de cinco anos previsto no § 1º do art. 43 do CDC deve corresponder ao primeiro dia seguinte à data de vencimento da dívida, por ser esse o entendimento que mais se coaduna com a função dos bancos de dados de inadimplentes de refletir com fidelidade a situação financeira dos devedores.

III. Da possibilidade de ocorrência de dano moral

Consequência lógica da adoção do termo inicial do prazo como o dia seguinte ao do vencimento da dívida é o de que o limite temporal de manutenção da informação do art. 43, § 1º, do CDC é examinado isoladamente em relação a cada anotação.

Assim, como cada inscrição negativa corresponde a uma dívida, ela individualmente não pode ficar cadastrada no banco de dados por período superior a 5 (cinco) anos do vencimento de cada singular débito inadimplido.

Por essa razão, passa a ser ilegal, devendo ser cancelada, a inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito referente a dívida prescrita ou quando já tenha passado mais de 5 (cinco) anos do dia seguinte ao seu vencimento.

Apesar da configuração dessa ilegalidade e do consequente dever de cancelamento, de ofício, da anotação, a imprecisão da informação constante no banco de dados de proteção ao crédito somente será apta a configurar danos morais na hipótese em que não existir uma só anotação lícita. De fato, a existência de uma única anotação atualizada e precisa a respeito da inadimplência do devedor, em regra, não interfere na garantia inerente aos direitos de sua personalidade, pois é da essência dos bancos de dados de proteção ao crédito conter informações sobre a inadimplência e, com base nisso, subsidiar a avaliação de risco na concessão de crédito.

Desse modo, os danos morais somente estarão caracterizados se forem absolutamente incorretas, em razão de imprecisão ou desatualização, todas as anotações constantes no cadastro de inadimplentes.

Aplica-se, quanto ao ponto, por analogia, o entendimento firmado em tese repetitiva de que “a ausência de prévia comunicação ao consumidor da inscrição do seu nome em cadastros de proteção ao crédito, prevista no art. 43 , §2º do CDC, enseja o direito à compensação por danos morais, salvo quando preexista inscrição desabonadora regularmente realizada” (REsp 1061134/RS, Segunda Seção, DJe 01/04/2009, sem destaque no original).

VI – Dispositivo Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para, reformando o acórdão recorrido, impor às recorridas a obrigação de não-fazer, consistente em não incluir em sua base de dados informações coletadas dos cartórios de protestos, sem a informação do prazo de vencimento da dívida, para controle de ambos os limites temporais estabelecidos no art. 43 da Lei 8.078/90”.

STJ


Foto: divulgação da Web

Empresa vai pagar R$ 37 mil a consumidora que teve o casamento atrasado por falta de energia

 

Dano Moral

 - Atualizado em 


A Celg Distribuição S/A (hoje Enel) firmou acordo com uma consumidora que teve a festa de casamento atrasada pela falta de energia elétrica. A concessionária de energia elétrica deverá para R$ 34 mil por meio de depósito judicial à mulher. O acordo foi homologado pelo desembargador Gerson Santana Cintra, da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO). O valor inclui todas as obrigações entre as partes, bem como custas processuais e honorários.

A mulher, noiva à época do ocorrido, narra na ação que o casamento estava marcado para às 20h30. Porém, devido a falhas de energia elétrica, a cerimônia ocorreu apenas às 22 horas, ou seja, mais de uma hora e meia de atraso no matrimonio em decorrência da má prestação de um serviço essencial.

Devido às várias quedas consecutivas, a noiva teve prejuízos, como a perda de alimentos que seriam destinados à alimentação dos convidados. Além de gastos com o pessoal contratado, como adicional por excesso do tempo com fotógrafos e filmagem.

“Conforme se pode verificar, o que seria o dia perfeito para a jovem requerente, em pouco tempo se tornou o seu maior transtorno, pois não podendo desfrutar de tudo aquilo que lutou e planejou com muito esforço e sacrifício para conseguir”, disse na inicial do pedido o advogado Tarles Alves da Silva, do escritório Alves & Rocha Advogados.

Caso fortuito

Em primeiro grau, a Celg havia sido condenada a pagar R$ 30 mil à mulher, a título de danos morais. A sentença foi dada pelo juiz Vôlnei Silva Fraissat, de Jussara, no interior de Goiás. O entendimento foi o de que a situação vivida pela consumidora supera a normalidade.

Contudo, antes de firmar o acordo, a Celg ingressou com recurso sob a alegação que se mostra ausente o dever de indenizar, já que impossível a qualquer concessionária de energia elétrica impedir suspensões no fornecimento, ainda que momentâneas. Isso porque as redes de transmissão percorrem quilômetros e estão sujeitos a danos, em sua maioria por caso fortuito ou força maior.

Defende que o acidente decorreu de caso fortuito, de modo que fica excluída a responsabilidade objetiva da concessionária. Não podendo ser a mesma incriminada por um fenômeno da natureza, haja vista não haver prova alguma de que a apelante, não prestou a devida manutenção nos postes de energia elétrica.

Acordo homologado

Após ingressarem com recurso, as partes firmaram acordo, sendo homologado pelo relator. O desembargador explicou que, conforme o Regimento Interno do TJGO, compete ao relator “homologar as desistências, ainda que o feito se ache em mesa para julgamento do recurso que havia sido interposto pelas partes”.  Em face da renúncia do prazo recursal, os autos devem ser remetidos ao juízo de origem, com as baixas de estilo.

TJGO/ROTAJURÍDICA


Foto: divulgação da Web

quarta-feira, 23 de junho de 2021

2ª turma do STF faz retroagir lei anticrime para crime de estelionato

 

Direito Penal

 - Atualizado em 


O caso concreto analisado pelos ministros envolve o dono de uma revendedora de automóveis acusado de estelionato.

Dispositivo da lei anticrime, que prevê a manifestação da vítima para levar a efeito uma acusação por estelionato, deve retroagir para beneficiar réu denunciado antes dessa nova regra. Assim decidiu a 2ª turma do STF na tarde desta terça-feira, 22.

Automóvel

O caso concreto envolve o dono de uma revendedora de automóveis acusado de estelionato (artigo 171 do CP), por ter vendido para outra pessoa o carro deixado na loja por um vizinho, em regime de consignação. Ocorre que, na época dos fatos, o Ministério Público podia apresentar a denúncia independentemente da vontade da vítima (ação pública incondicionada).

Votos

Edson Fachin, relator, explicou que a alteração da lei anticrime ocorreu formalmente no Código Penal, e não no Código de Processo Penal. “Diferentemente das normas processuais puras, orientadas pela regra do artigo 2º do CPP (segundo o qual lei processual penal não invalida os atos realizados sob a vigência da lei anterior), as normas, quando favoráveis ao réu, devem ser aplicadas de maneira retroativa, alcançando fatos do passado, enquanto a ação penal estiver em curso”, afirmou.

Para o ministro, a jurisprudência é firme no sentido de que, em razão desse princípio constitucional, a modificação da natureza da ação pública para ação penal condicionada à representação deve retroagir e ter aplicação mesmo em ações penais já iniciadas. O ministro afirmou, ainda, que a aplicação da norma mais favorável ao réu não pode ser um ato condicionado à regulação legislativa. A seu ver, é o caso de intimar a vítima para que diga se tem interesse no prosseguimento da ação, no prazo legal de 30 dias.

Gilmar Mendes afirmou que a norma que trata da ação penal tem natureza mista (material e processual), por acarretar reflexos nas duas esferas. Portanto, deve retroagir em benefício do réu, devendo ser aplicada em investigações e processos em andamento, ainda que iniciados antes da sua vigência.

Também no entendimento do ministro Nunes Marques, a lei de 2019 introduziu uma norma de conteúdo misto, com reflexo na probabilidade da conduta em tese delituosa, o que afasta a regra do artigo 2º do CPP, segundo a qual os atos jurídicos devem ser regidos pela lei da época em que ocorreram. Dessa forma, a seu ver, por ser mais favorável ao réu, a regra deve retroagir.

Nesse mesmo sentido, votaram a ministra Cármen Lúcia e o ministro Ricardo Lewandowski.

Divergência

O que foi decidido hoje pela 2ª turma é contrário ao que já deciciu a 1ª turma. Em outubro de 2020, os ministros da 1ª turma do STF decidiram, por unanimidade, que é inaplicável a retroatividade do § 5º do art. 171 do CP às hipóteses onde o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor da lei 13.964/19.

 STF/MIGALHAS


Moradora que teve a casa danificada por obra de vizinho deve ser indenizada

 

Direito Civil

 - Atualizado em 


Os desembargadores da 7a Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, por unanimidade, deram provimento ao recurso da parte autora para incluir na sentença que condenou o réu a reparar os danos causados no imóvel vizinho, também a condenação ao ressarcimento dos valores gastos com aluguel, realização de perícia e danos morais.

A autora narra que, em julho de 2018, seu vizinho iniciou uma obra para demolir uma casa antiga que havia no local e construir uma nova. Contou que sua casa e do vizinho são do tipo geminada, ou seja, são anexas, compartilhando estruturas como paredes e telhado. Assim, a obra realizada pelo réu resultou em danos à estrutura de sua residência, tais como rachaduras, fissuras e deslocamento da laje, implicando em risco à integridade física de sua família, motivo pelo qual teve que se mudar. Diante do ocorrido, ajuizou ação requerendo o ressarcimento dos valores gastos com aluguel e perícia realizada no imóvel, despesas necessárias à recuperação do imóvel e indenização a título de danos morais.

O réu apresentou contestação, argumentando que comunicou à autora o início das obras e que faria eventuais reparos que fossem necessários. Sustentou que cumpriu com todas as exigências do laudo de impacto na vizinhança, expedido pela Defesa Civil, e a obra foi liberada. Afirmou que o laudo concluiu que os danos causados à propriedade vizinha foram poucos, mas a mesma não permitiu que seus funcionários entrassem no imóvel para efetuar os reparos.

Na 1a instancia, a juíza entendeu que a obra do réu causou danos à propriedade da autora, razão pela qual julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando-o apenas a efetuar os reparos descritos no laudo pericial.

Inconformada, a autora interpôs recurso, que foi parcialmente acatado para incluir na condenação os demais pedidos, quais sejam: ressarcimento com aluguéis, gasto com o laudo pericial e indenização pelos danos morais, além das totalidade das custas processuais e honorário advocatícios.

O colegiado esclareceu que, conforme vídeos e documentos juntados aos autos, a autora foi obrigada a se mudar, devido à presença de risco iminente decorrente da obra, razão pela qual deve ser ressarcida pelos aluguéis que teve que arcar. Quanto ao dano moral, o colegiado registrou que “o transtorno sofrido pela autora e seus familiares ultrapassou os limites do mero convívio entre vizinhos de casas geminadas para se transformar na presente disputa judicial, cujos vídeos antes referidos, a leitura dos laudos periciais e as fotografias que instruem os autos, se mostram suficientes a indicar o abalo material e psicológico que enfrentaram ante à insalubridade de se viver numa casa com tamanha infiltração, necessidade de escoramento e risco iminente de suas vidas.”

Pje2: 0711564-96.2019.8.07.0001

Sócio-gerente só responde ação de execução fiscal quando há infração à lei ou excesso de poderes

 

Direito Tributário

 - Atualizado em 


A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), para fins de adequação do julgamento do processo ao Tema 444 firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), deu provimento ao agravo de instrumento para excluir o nome de sócio-gerente da empresa devedora constante da Certidão de Dívida Ativa (CDA) após a citação da massa falida.

A exclusão havia sido efetivamente determinada mas sob fundamento diferente, o da prescrição quinquenal.
Destacou o relator, juiz federal convocado Rodrigo Rigamonte Fonseca, que o STJ, em julgamento sob sistemática dos recursos repetitivos (Tema 444), firmou o entendimento de que é vedada a substituição da CDA para incluir os sócios da devedora no polo passivo quando não há comprovação quanto ao excesso de poderes, infração à lei ou ao estatuto.
Acrescentou ainda o magistrado que a jurisprudência do STJ é no sentido de que o inadimplemento de tributo não configura a hipótese de inclusão, e que, em caso de dissolução pela via da falência não há que se falar em dissolução irregular.
Dessa forma, tendo em vista que é vedada a substituição da CDA para incluir os sócios da devedora no polo passivo e que não há elemento de convicção quanto ao excesso de poderes, infração à lei ou ao estatuto e quanto à hipótese de dissolução irregular, seja em momento anterior ou posterior à citação da devedora principal, resta impossibilitada a inclusão do sócio no polo passivo da execução.
O Colegiado, acompanhando o voto do relator, deu provimento ao agravo para excluir o sócio-gerente do polo passivo da execução fiscal por não se enquadrar nas hipóteses de inclusão acima descritas.
Processo 0032659-14.2011.4.01.0000
Data do julgamento: 04/05/2021
Data da publicação: 06/05/2021
RBPS
Assessoria de Comunicação Social
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

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ITBI deve ser calculado com base no valor venal do IPTU ou da transação

 

Direito Tributário

 - Atualizado em 


Para o cálculo do imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI), deve ser considerado o valor venal do IPTU ou o valor da transação, o que for maior — afastando o “valor de referência” usado pela administração municipal. O entendimento é da 18ª Câmara de Direito Público do TJSP ao confirmar liminar favorável a um contribuinte em uma ação contra o município de São Paulo.

De acordo com o relator, desembargador Luiz Burza Neto, a prefeitura da capital, ao adotar, no mesmo exercício, um valor venal para fins de cálculo do IPTU e outro, mais elevado, para o cálculo do ITBI, afrontou os princípios da segurança jurídica e da legalidade estrita.

“Não parece razoável que um mesmo imóvel apresente valores venais distintos, segundo se trate de lançamento de ITBI ou de IPTU. É sabido que o valor venal atribuído ao imóvel, e que é utilizado como base para o pagamento, tanto do IPTU quanto do ITBI, no mais dos casos é inferior ao real valor de mercado”, afirmou o magistrado.

A advogada tributarista e sócia do Pereira do Vale Advogados, Rafaela Calçada da Cruz, que representou o contribuinte no processo.

Para ela, a decisão é um “precedente importante”, pois, sem a ordem judicial, o contribuinte seria obrigado a arcar com o valor do ITBI muito superior ao que restou decidido. No caso, afirmou Cruz, a quantia arbitrada pelo município era 68% maior em relação ao valor que foi definido pelo Poder Judiciário.

“Diante disso, se alguém estiver nessa situação, o ideal é adotar a medida judicial antes de recolher o imposto para evitar ter que se sujeitar à restituição do valor por meio de precatório, que, como é cediço, é uma via morosa”, destacou a advogada.

1062389-44.2020.8.26.0053

TJSP/CONJUR


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