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domingo, 22 de março de 2020

Fundo da Petrobras, que iria para a educação, será usado no combate ao coronavírus


A pandemia causada pelo novo coronavírus é uma ameaça real e eminente, que irá repercutir em todo o sistema de saúde caso não sejam adotadas medidas de efeito imediato. 
Segundo ministro, todas as medidas para enfrentar pandemia devem ser tomadas
Carlos Moura/SCO/STF
Foi com base nesse entendimento que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, decidiu que os recursos provenientes do fundo da “lava jato” devem ser utilizados para combater o novo coronavírus. A decisão, tomada neste domingo (22/3), atende a uma solicitação feita pela Procuradoria-Geral da República. 
Com a determinação, R$ 1,6 bilhão proveniente de um acordo assinado entre a Petrobras e os procuradores da “lava jato” serão direcionados para que o Ministério da Saúde enfrente o surto da Covid-19. Originalmente, a quantia seria destinada ao Ministério da Educação.
“A gravidade da emergência causada pela pandemia do Covid-19 exige das autoridades brasileiras, em todos os níveis de governo, a efetivação concreta da proteção à saúde pública, com a adoção de todas as medidas possíveis para o apoio e manutenção das atividades do Sistema Único de Saúde”, afirma Moraes. 
Ainda segundo ele, “a iniciativa da PGR e demais autoridades anuentes está à altura do interesse de toda a sociedade na melhor estruturação e apoio ao Sistema Único de Saúde, que depende o bom estar da grande maioria dos brasileiros”. 
O pedido da PGR foi feito na última quinta-feira (19/3). No dia seguinte, no entanto, Moraes afirmou que a análise da solicitação dependia do “prévio requerimento conjunto de todos os signatários do acordo sobre a destinação dos valores”. 
Assim, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o vice-presidente do Senado Antonio Anastasia (PSD-MG) anuíram com a proposta. A Advocacia-Geral da União, em ofício, também solicitou que o repasse à saúde fosse feito. 
Na decisão, Moraes lembra que embora tenha ficado decidido anteriormente que a quantia de R$ 1,6 bilhões fosse destinada à educação, o dinheiro nunca foi utilizado. Assim, nenhuma ação ou programa seria descontinuado. 
Em fevereiro, o ministro chegou pedir informações para o juiz Luiz Antonio Bonat, titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, para saber onde parte da quantia foi parar. 
Clique aqui para ler a decisão
ADPF 568
 é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 22 de março de 2020, 15h29

Casal que voltou da Europa e zombou do coronavírus deverá ficar isolado


O juíza Helia Regina Pichotano, da 2ª Vara de Itapira (SP), ordenou na última sexta-feira (20/3) que um casal que voltou de uma viagem à Europa se submeta a exames para saber se contraiu o novo coronavírus. Eles também deverão ficar em isolamento. A decisão foi tomada na última sexta-feira (20/3).
Casal deverá fazer exame para saber se contraiu novo coronavírus
Jarun Ontakrai
A determinação atende a uma ação civil pública apresentada pelo Ministério Público. O processo teve início após os dois divulgarem vídeos em que zombam da possibilidade de estarem infectados. 
“Conforme documentos juntados, verifica-se a presença das verossimilhanças das alegações apresentadas. O perigo da demora, por outro lado, decorre dos potenciais danos à saúde da coletividade, por conta da ausência de avaliação médica, bem como, de medida de isolamento”, afirma a decisão. 
Após voltar de viagem, o casal divulgou dois vídeos zombando da população de Itapira, que estava com medo de que os dois estivessem contaminados. 
“A gente tava viajando na Europa e isso pode ter causado algum mal para as pessoas. Mas como nós fomos confinados pela população, porque a nossa saúde está muito debilitada, aproveitando que por 40 dias a gente não pode fazer nada, nós vamos pedalar para ver onde a nossa saúde vai aguentar. Porque já que nós estamos com coronavírus, nós vamos levar ele para o mundo”, ironiza a mulher em um dos vídeos. 
Ainda segundo ela, “parece que mesmo com todo o álcool ingerido na viagem — gim, hidromel, tequila, vinho, cerveja corona — não foi o suficiente para evitar o vírus”. “Acabei de subir a Boa Vista e estou sentindo falta de ar. Não sei, parece que não está ventilando muito bem não”. 
A juíza ordenou que o casal realize os exames necessários imediatamente, sob pena de multa diária de R$ 10 mil caso haja descumprimento. 
Clique aqui para ler a decisão
Processo 1000582-45.2020.8.26.0272

conjur

Com união estável reconhecida, homem consegue direito a pensão após a morte do companheiro


A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região – TRF1 manteve sentença que reconheceu o direito de um homem a receber pensão por morte de seu companheiro, que era professor aposentado do Colégio Militar do Rio de Janeiro. A União havia recorrido da decisão em primeiro grau, que concedeu o benefício, com a alegação de que não foram preenchidos os requisitos para concessão da pensão por morte.
A segunda instância manteve a sentença inicial, reconhecendo a união estável entre os dois. O colegiado acompanhou, com unanimidade, o entendimento e a exposição do desembargador federal Francisco de Assis Betti, relator do caso. Em sua decisão, ele considerou o entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF sobre a matéria.
Para o reconhecimento da união estável, o requerente comprovou que residia no mesmo endereço que o servidor, apresentou fatura de cartão de crédito em que constava como seu dependente, além de testamento público em que era instituído como herdeiro. A decisão também considerou depoimentos de testemunhas que atestaram o convívio do casal por mais de 30 anos.
Via jurisprudencial tem assegurado direitos aos casais homoafetivos
“Cada decisão da Justiça concedendo direito aos pares formados por pessoas do mesmo sexo é um significativo avanço, porque essa foi uma construção pela via jurisprudencial. A Justiça, cada vez que reafirma tais direitos, endossa ainda mais a posição do Poder Judiciário, como um todo, sobre essa matéria”, comenta Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional e presidente da Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
O Poder Legislativo anda na contramão do Judiciário na garantia de direitos da população LGBTI. Falta, segundo Maria Berenice, previsões legais que deem conta de pautas específicas dessa parcela da sociedade.
“Diante da inércia do Legislativo, fruto de um absoluto preconceito, uma omissão quase criminosa que deixa de fora do âmbito da tutela jurídica do Estado um segmento da população, a busca por direitos acaba sempre batendo às portas do Judiciário”, analisa a advogada.
Ela avalia que pleitos como esse, envolvendo garantias ao companheiro homoafetivo, são recorrentes no ordenamento jurídico brasileiro. Com um entendimento já cristalizado pelo STF, o tema tem encontrado resoluções satisfatórias logo nos juízos de primeiro grau.
“Como, de modo geral, as decisões de primeiro grau não têm a repercussão e publicidade que é dada aos colegiados, há essa falsa impressão de que as demandas se reduziram. As pessoas seguem ‘saindo do armário’ na busca pelo reconhecimento dos direitos. Por isso, cada decisão como essa precisa ser festejada”, afirma Maria Berenice.
Direito homoafetivo e previdenciário
Apesar da jurisprudência favorável, o Direito Previdenciário ainda traz obstáculos para as famílias formadas por casais homoafetivos. “A legislação brasileira, como um todo, não faz referência a uniões homoafetivas para nada, muito menos para concessão de direitos”, explica Maria Berenice.
“O Direito Previdenciário normalmente tem uma aplicação de estrita legalidade. Reconhecer união de pessoas do mesmo sexo é, sim, atender ao princípio da legalidade, porque a decisão do STF, de 2011, identificando-as como união estável, torna inquestionável todo e qualquer direito, como foi afirmado no julgamento”, avalia a advogada.
TRF1
#companheiro #uniãoestável #pensão #morte
Foto: pixabay
correio forense

Desembargadora reverte decisão que suspendeu atividades da JBS e Seara


Determinados setores da economia são indispensáveis para o desenvolvimento nacional, exercendo insubstituível papel à estabilização da sociedade. Assim, sua eventual paralisação implica riscos à vida, saúde e segurança. 
Decisão havia paralisado atividades da JBS e Seara
Foi com base nesse entendimento que a presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, desembargadora Maria de Lourdes Leiria, derrubou uma decisão que suspendia as atividades da JBS e da Seara em Forquilhinha e Nova Veneza (SC) a partir de sábado (21/3) em razão do novo coronavírus. 
A magistrada analisou o artigo 9, parágrafo 1º, da Constituição, e o artigo 9 da Lei  7.783/1989, referentes ao exercício do direito de greve. Segundo ela não pode haver paralisação que resulte prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos. 
A desembargadora destacou também que a legislação recente reforça explicitamente o caráter essencial de serviços alimentícios, ainda que em tempos de coronavírus. 
De acordo com a decisão, a Lei 10.282/20, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública, veda a “restrição a circulação de trabalhadores que possa afetar o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais”, resguardando setores “indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”, como o de produção, distribuição e comercialização de produtos de saúde, higiene, alimentos e bebidas. 
“Visto isso, exsurge que todo o conjunto normativo, há mais de trinta anos, tem classificado como atividade essencial a produção, distribuição e comercialização de gêneros alimentícios, entre os quais inclui-se os frigoríficos”, diz a magistrada. 
A desembargadora ressalta, ainda, “que as impetrantes demonstraram pelos documentos juntados com a petição inicial que já tomaram medidas de prevenção e combate ao coronavírus junto a seus colaboradores, modificando a rotina de trabalho em benefício deles”.
As medidas de prevenção incluem a disponibilização de álcool em gel e líquido em todos os ambientes da empresa com fluxo de pessoas; higienização reforçada e contínua em todas as áreas de circulação e descanso; disponibilização de máscaras e descartáveis no ambulatório para os colaboradores que tenham interesse em utilizar; contratação de ônibus adicionais para que seja mantida distância segura entre os funcionários; entre outras. 
As empresas foram representadas neste caso pelos advogados Francisco Caputo, do escritório Caputo Bastos e Serra, e Cesar Pasold Júnior, do Marcelo Tostes Advogados.
"O setor produtivo está colaborando ao cumprir as determinações das autoridades sanitárias e os protocolos da OMS e do Ministério da Saúde. As fábricas estão funcionando em regime adaptado à realidade do coronavírus e os funcionários contam com todas as proteções necessárias", afirma Caputo. 
Ainda segundo ele, "a Seara está fazendo sua parte para conter a disseminação do novo coronavírus e, ao mesmo tempo, não deixar a população desabastecida de produtos alimentícios essenciais". 
Suspensão das atividades
A determinação contraria decisão da 4ª Vara do Trabalho de Criciúma (SC), que determinou na sexta-feira (20/3) a paralisação integral das atividades da JBS e Seara “sem prejuízo de remuneração” aos trabalhadores. 
Na decisão, o juiz Paulo André Cardoso Botto, ordenou, ainda, que as empresas poderiam, “de comum acordo com a entidade sindical, apresentar ao juízo, na sequência, plano de redução de atividades que salvaguarde a saúde de seus empregados, no sentido de evitar a paralisação”. 
A suspensão das atividades atendia a uma ação coletiva movida pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Carnes e Derivados, Frangos, Razões Balanceadas, Alimentação e Afins de Criciúma e Região. 
Clique aqui para ler a decisão
Processo 0000144-18.2020.5.12.0000

STJ: Execução ajuizada contra pessoa falecida e redirecionada aos herdeiros não é válida


A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que reconheceu a validade de uma execução proposta contra devedor falecido três anos antes do ajuizamento e posteriormente redirecionada para os seus herdeiros.
A decisão aconteceu com base em precedentes do STJ. Para a turma, a execução não poderia ter sido direcionada aos sucessores, uma vez que não foi estabelecida a relação processual com o devedor original. Assim, é necessário novo ajuizamento da ação contra o espólio ou os herdeiros.
Nos autos, os herdeiros afirmaram que foram surpreendidos com o ajuizamento, feito pelo banco credor, de uma ação para cobrar uma dívida de quase R$ 5 milhões, relativa ao financiamento para a compra de um imóvel.
Segundo eles, o banco demorou muito tempo para iniciar a cobrança, já que os atrasos começaram em 1995 e a ação foi proposta em 2008. Além disso, afirmaram que os direitos sobre o imóvel foram cedidos a um terceiro, em 1993. O pai faleceu em 2005, sem que o bem tenha sido tratado no inventário, e o banco nunca os notificou a respeito da dívida.
Em primeira instância, o juiz extinguiu a execução por reconhecer a prescrição, com base no prazo de cinco anos, conforme previsto no artigo 206, § 5º, inciso I, do Código Civil.
Já o TJDFT reformou a sentença, afirmando que embora o contrato de financiamento previsse o vencimento antecipado da dívida por falta de pagamento, o prazo de prescrição deveria ser contado a partir do término do pacto firmado originalmente, ou seja, da data de vencimento da última parcela. Também foi exposto que não foi demonstrada a anuência do banco com relação à transferência de direitos sobre o imóvel.
No STJ, a ministra Nancy Andrighi, como relatora do recurso especial, ressaltou uma jurisprudência do tribunal que afirma que, como decidido pelo TJDFT, o vencimento antecipado realmente não altera o termo inicial da contagem da prescrição.
No entanto, em relação ao ajuizamento da execução contra pessoa já falecida, ela disse que o STJ entende ser necessária a extinção do processo, em razão de não estar presente o reconhecimento da legitimidade passiva.
“Portanto, impossível a ocorrência de simples redirecionamento”, declarou Nancy Andrighi, afirmando que o credor deveria ter ajuizado outra execução, dessa vez contra o espólio ou os herdeiros do devedor”, sentenciou.
Especialista detalha acerto na decisão
O juiz Rafael Calmon, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, destaca que, a rigor, a decisão foi correta, uma vez que a legitimidade tanto para ajuizar, quanto para suportar uma execução, é daquele que figura no título executivo.
“Os artigos 778, caput, e 779, I, do CPC são bem claros nesse sentido. Mas, algumas ocorrências supervenientes no mundo dos fatos podem autorizar que pessoas não diretamente previstas no título possam figurar no polo ativo ou passivo de execuções. É nesse momento que surge a chamada ‘legitimidade derivada’ prevista pelo §1º do artigo 778 e pelos incisos II a V do artigo 779 do mesmo Código”, destaca.
No caso, houve o falecimento do devedor originário, o que, em tese, atrairia a incidência da regra prevista pelo artigo 779, II do CPC. Mas o juiz explica que esse falecimento ocorreu antes do ajuizamento da ação, fato este que impediria que o credor propusesse a execução contra o falecido e, somente em um segundo momento, pretendesse redirecioná-la a seus sucessores.
Para ele, todo e qualquer processo litigioso – e o de execução se inclui nessa regra – deve possuir uma parte ativa e uma passiva, no mínimo. E, se essa parte for uma pessoa natural, ela tem que estar viva, por óbvio.
“As hipóteses de falecimento da parte são disciplinadas pelo próprio Código de Processo Civil. De acordo com ele, se o falecimento do devedor ocorrer antes da propositura da execução, o exequente deverá fazer a comprovação desse fato já em sua inicial executiva, inserindo no polo passivo apenas o espólio, o herdeiro ou o sucessor, conforme seja o caso (art. 779, II). Se o óbito ocorrer durante o processo, aquele deverá promover a alteração exigida por meio do procedimento de habilitação (arts. 687 e ss.) e não por mero ‘redirecionamento’”, detalha.
Rafael Calmon esclarece que como o devedor já havia falecido antes mesmo do ajuizamento da execução, esta deveria ter sido inicialmente direcionada a seu espólio, a seus herdeiros ou sucessores, conforme fosse o caso. Mas jamais podendo ser pura e simplesmente “redirecionada” a estes.
“Por isso ela foi corretamente extinta. Em relação ao falecido por falta de pressuposto processual (a existência de uma parte – CPC, art. 485, IV, aplicável subsidiariamente à execução), e, em relação a seus filhos, por falta de condição da ação (legitimidade passiva – CPC, art. 485, VI, aplicável subsidiariamente à execução)”, descreve.
No que toca à prescrição estabelecida pelo art. 206, §5º, I, do Código Civil, Rafael Calmon sinaliza que ela não poderia ser aplicada ao caso por repercutir sobre o mérito, o qual somente poderia ser analisado caso fossem ultrapassadas as questões de índole processual atinentes aos pressupostos processuais e às condições da ação, que não foram no caso concreto.
“Mesmo sequer sendo aplicável, sua análise se deu de forma correta pelo STJ, pois o prazo prescricional somente pode ter início da data fixada no contrato e não do dia de eventual vencimento antecipado da dívida por ele documentada”, finaliza.
STJ
#execução #pessoa #falecida #redirecionamento #herdeiros
Foto: pixabay
Correio forense

A peste, de Albert Camus, e o eterno retorno das pragas e das aflições


Em 1947, o escritor argelino Albert Camus (1913-1960) publicou A peste. Versão romanceada da filosofia existencialista, A peste é um livro que trata da solidariedade que a todos devemos, da liberdade de escolha e da responsabilidade sobre nossas escolhas. Os tristes e preocupantes fatos dos últimos dias reposicionaram esse livro no centro das atenções de quem a respostas frívolas e não pensadas prefere uma reflexão mais séria sobre as contingências da vida. Esse é o tema dos embargos culturais dessa semana.
Em uma cidade do norte da Argélia (Oran é o nome), em 1940, um médico encontrou um rato morto ao deixar seu consultório. Noticiou o fato ao responsável pela limpeza do prédio, que se mostrou incrédulo. No dia seguinte, outro rato foi encontrado, morto, e no mesmo lugar. A esposa do médico tinha tuberculose e foi levada para um sanatório. O médico recebeu um jornalista francês que pretendia entrevistá-lo sobre as condições de vida dos árabes da cidade.
A quantidade de ratos parecia aumentar exponencialmente. Os ratos começaram a ser queimados. Em um único dia, 8 mil ratos foram coletados e encaminhados para cremação. A cidade entrou em pânico. As pessoas sofriam com muita febre, e as mortes se multiplicavam. Decretou-se um “estado de praga”. Os muros da cidade foram fechados. Iniciou-se a quarentena. Preocupava-se com a expansão da doença.
Famílias foram separadas. Os mais doentes foram conduzidos para outros pontos da cidade. O padre local fez um inflamado sermão dizendo tratar-se de um castigo divino e que a cidade o merecia. Estavam sofrendo. Mas mereciam, dizia o padre. Prisioneiros eram usados para movimentar e enterrar cadáveres. Os corpos se amontoavam nas ruas. Crianças morriam. O padre ainda achava que tudo decorria dos planos divinos. Afirmava que os cristãos deveriam aceitar o destino. O padre morreu. Camus era um anticlerical. Mas era realista.
Em determinado momento, as mortes começaram a diminuir. Fechou-se um ciclo. As portas da cidade se abriram. As famílias, então separadas, começavam a se reunir. Acabou. A praga durou 10 meses. O enredo, no entanto, é longo, e conta com muitas variações e subtemas. Vale a pena uma leitura detida.
Esse livro estonteante é uma clara e direta crítica ao nazismo e à ocupação militar alemã, que humilhou e subjugou os franceses. Camus participou da Resistência, grupo que se insurgia contra os alemães que ocupavam Paris. Escrito ao longo da guerra, com a expectativa que de que a aflição passasse um dia, A peste é uma lembrança de que o pior sofrimento um dia se acaba. Noites são escuras. Mas não são eternas. A peste é também discurso contra qualquer forma de opressão humana, da qual o nazismo revelava-se como a mais opressiva de todas. A peste é ainda atitude de incredulidade para com o absurdo, contra o qual conduz revolta necessária e libertadora.
Camus concluiu esse desesperado livro lembrando que o bacilo da peste não morre e não desaparece. Avisou-nos que o bacilo da peste fica “dezenas de anos a dormir nos móveis e nas roupas”. Ainda, advertiu que a peste “espera com paciência nos quartos, nos porões, nas malas, nos papeis, nos lenços”. E quando volta, “para nossa desgraça, manda os ratos morrerem numa cidade feliz”. Trocando-se ratos e bacilos por outros vírus e pragas tem-se o quadro aflitivo que eu e o leitor vivemos. E os mais fragilizados mais ainda.
 é livre-docente pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutor pela PUC-SP.

Revista Consultor Jurídico, 22 de março de 2020, 8h02

Tributaristas aprovam pacote contra coronavírus e sugerem ampliação


O anúncio de um pacote de R$ 147,3 bilhões pelo ministro Paulo Guedes para manter a economia girando diante da pandemia do coronavírus foi bem recebido por advogados tributaristas. Eles alertam, contudo, para a necessidade de mais medidas e para o curto prazo de validade de algumas das ações.
Advogados tributaristas aprovam pacote econômico anunciado por Paulo Guedes 
Conforme o governo, o plano tem como objetivos principais a proteção dos mais vulneráveis, como os idosos, e a manutenção dos empregos. Dentre essas medidas, estão o diferimento do prazo de pagamento do FGTS, a redução de 50% nas contribuições do sistema S e o diferimento da parte da União no Simples Nacional, todas com vigência prevista de três meses.
Daniel Corrêa Szelbracikowski, tributarista, sócio da Advocacia Dias de Souza, avalia que não se trata propriamente de medidas de estímulo à economia, mas tentativas de preservação das empresas e, consequentemente, dos empregos neste momento de crise econômica decorrente da pandemia.
“Ao postergar os pagamentos do FGTS, de parte do Simples, e reduzir as contribuições ao sistema S, o governo busca dar um fôlego aos empresários que terão abrupta diminuição de receitas neste período e, ainda assim, precisarão manter os salários de seus funcionários em dia. São boas iniciativas. Porém, a depender do cenário que se avizinha, talvez seja recomendável estender o diferimento para outros tributos, tais como as contribuições ao PIS e COFINS e, eventualmente, perdoar no futuro os tributos diferidos”, opina.
Szelbracikowski lembra, ainda, que diferimento é mera postergação do pagamento. “Se a crise demorar a ir embora, o empresário pode ter muita dificuldade para pagar esses tributos diferidos que se somarão aos tributos correntes”, conclui.
O tributarista Richard Edward Dotoli, sócio do Costa Tavares Paes Advogados e doutor em Política Fiscal Tributária, defende a suspensão imediata da retenção do Imposto de Renda para rendas até R$ 10 mil, permitindo que exista um efetivo recebimento de recursos. “Esse imposto poderia ser cobrado apenas em 2021. É possível também limitar o prazo da retenção”, explica.
Dotoli também vê a necessidade de desonerar a folha de pagamentos das empresas. “Outra experiência de sucesso é garantir uma renda mínima, reduzindo ou postergando, por um período específico (seis meses por exemplo), os tributos incidentes sobre a folha de pagamentos para empregados com rendimentos de até cinco salários mínimos. O governo federal garantiria o pagamento de um percentual do salário, permitindo que o empregador deduza o valor pago a esses empregados, das contribuições incidentes sobre a folha de salários”.
Para Gabriel Lima, tributarista do Nelson Wilians e Advogados Associados, “as medidas são importantes para manter a saúde financeira das empresas”.
"É importante o governo estar atento para a economia. Além da questão da queda dos valores das empresas que possuem ações negociadas na bolsa de valores, o comércio local, como lojas varejistas, restaurantes, cinemas etc., está sendo muito afetado. Com a população em casa, o dinheiro deixa de circular. Então essas medidas são importantes para manter a saúde financeira das empresas, o fluxo de caixa e, principalmente, manter a economia do país funcionando”, diz.
Lima destaca ainda que Estados e municípios deveriam criar facilidades para pagamentos de tributos, como ICMS e ISS. 
Já a tributarista Erika Tukiama, sócia de Chiarottino e Nicoletti Advogados, concorda que as medidas propostas pelo governo são, em geral, positivas. “Mas poderiam incluir algo de caráter mais abrangente, que envolvesse a participação das empresas e empresários em geral, tal como a concessão de incentivos fiscais para aqueles que comprovadamente colocassem suas estruturas produtivas e de serviços à disposição de iniciativas de combate à pandemia, a exemplo do que a LVMH fez na França, ao alocar parte da sua produção de perfumes para a manufatura de álcool em gel para doação ao governo”, assinala.
Revista Consultor Jurídico, 22 de março de 2020, 9h02